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11 de setembro de 2025

No Meio da Noite, de Riley Sager: um dos melhores thrillers dos últimos tempos


Ai, como é bom amar um livro, né?! E olha que eu não sou uma grande fã de thriller/suspense/mistério. De certa forma, isso até ajuda a explicar porque eu gostei desse livro em específico. Apesar de ser um thriller, No Meio da Noite tem um toque de fantasia e de terror (gêneros que eu gosto bastante). 

A história é a seguinte: em 1994, Billy, um doce menino de apenas 10 anos, desaparece misteriosamente no meio da noite. Na noite em questão, Billy e seu melhor amigo, Ethan, estavam acampando no quintal da casa de Ethan. Quando Ethan acorda na manhã seguinte, seu amigo não está lá e há um grande rasgo na barraca. 

30 anos depois, Ethan está de volta ao seu antigo lar de infância. Com a mudança dos pais para outra cidade e seu recente divorcio, esse retorno parecia a coisa certa a se fazer. Mas estar de volta a casa onde tudo aconteceu intensifica ainda mais o luto. Na verdade, o desaparecimento de seu melhor amigo de infância nunca chegou a ser um assunto superado para Ethan, que já fez muita terapia e continua tendo pesadelos com aquela noite.

Ethan precisa saber o que aconteceu naquela noite e nos levará junto com ele nessa busca por respostas. O livro, então, alterna entre passado e presente, mostrando Ethan nos dias atuais, reencontrando seus amigos e colegas de infância, agora adultos, e mostrando o que aconteceu naquele fatídico 15 de julho.

Eu ameeeeeei cada página desse livro, cada nova descoberta, cada plot twist, cada revelação e cada novo personagem que foi sendo inserido na história. O livro tem um tom sombrio que beira o sobrenatural e, em vários momentos, eu me perguntei se o desfecho teria realmente explicações sobrenaturais.

Uma série não saia da minha cabeça ao longo de toda a leitura: Dark. Se você assistiu Dark e gostou, leia No Meio da Noite. Não apenas o enredo, mas a atmosfera triste e sombria do livro lembram muito a série alemã. Fora que tem crianças e um instituto que faz pesquisas estranhas e secretas. Eu fiquei fascinada com a vibe conspiratória que o livro tem.

Essa não foi a minha primeira experiência com o autor. Dele, eu já tinha lido O Massacre da Família Hope e amado. Mas No Meio da Noite conseguiu ser ainda melhor. Claro que há algumas coisas repetidas, como o tom sobrenatural e a alternância entre passado e presente, mas a fórmula é boa e tão bem executada que eu poderia ler mais 10 livros dele com a mesma fórmula e continuar amando.

Em O Massacre da Família Hope eu acabei tirando uma estrela por conta do desenrolar lento e do final excessivamente mirabolante. Mas, No Meio da Noite não repete nenhum desses erros. Pra mim, o livro tem exatamente o tamanho que deveria. Não enrola, mas consegue desenvolver cada ponto muito bem. E o final foi mais "pé no chão", o que eu tendo a preferir. Enquanto O Massacre da Família Hope foi um livro 4 estrelas, No Meio da Noite é um 5 estrelas e favoritado.

O final é lindo lindo lindo. Cheguei a dar uma lacrimejada. Se fosse pra forçar uma reclamação, eu gostaria de saber mais sobre o tal instituto. Se o autor escrevesse um spin off só sobre o instituto eu iria correndo ler. Mas não tenho do que reclamar. Uma leitura realmente deliciosa, envolvente, que me fez entrar madrugada a dentro lendo.

O livro fala superficialmente sobre traumas, luto e traz algumas reflexões docemente amargas sobre ser uma criança "estranha" e o peso que isso tem até na vida adulta. Pegue o melhor de Stephen King, junte com a atmosfera sombria de Dark e uma pitada de Freida McFadden e você terá No Meio da Noite. RECOMENDO!!!

Título Original: Middle of the Night ✦ Autor: Riley Sager
Páginas: 368 ✦ Tradução: Renato Marques ✦ Editora: Intrínseca
Livro recebido em parceria com a editora
Ajude o blog comprando o livro através do nosso link!

4 de setembro de 2025

Decidi Viver Como Eu Mesma: lições de Kim Suhyun para uma vida mais leve e autêntica

Decidi Viver Como Eu Mesma é aquele tipo de livro rápido, com textos curtos e reflexivos que trazem lições de vida. No geral, eu gosto de livros assim, mas acho difícil encontrar algum que realmente traga algo de novo e não diga apenas o que outros 10 livros desse mesmo tipo já disseram.

Nesse livro, a autora se utiliza de suas próprias experiências e emoções para estabelecer lições sobre autorrespeito, autoestima, saúde mental e relacionamentos. Iniciando com um relato pessoal, a autora conta que, ao se tornar adulta, passou a se sentir pequena e patética, que se culpava por não conseguir realizar seus sonhos e que encontrou conforto na escrita deste livro.

Para a autora, uma das maiores fontes de sofrimento é tentar ser quem você não é, se guiando por valores e regras sociais que você não acredita para tentar encontrar um sucesso que seja reconhecido e validado pelos outros. Kim Suhyun defende que, para acabar com esse sofrimento, é preciso aprender a viver como você mesma.

Mas como fazer isso na prática? Kim guia o leitor através de mais de 60 lições que incluem, por exemplo: Não seja modesto a ponto de afetar a sua autoestima, Desenvolva seu estilo pessoal, Não siga um roteiro aleatório, Expresse seus sentimentos, Seja generoso e Deixe espaço para o erro.

Cada lição vem acompanhada de um pequeno texto onde a autora dá exemplos pessoais ou conta casos que ilustrem aquela lição. A maioria das lições também vem acompanhada de uma ilustração fofa que torna a leitura ainda mais leve e divertida.

Minha experiência com essa leitura foi agradável, mas não transformadora. Não teve nenhuma lição que tenha sido super inovadora ou grandiosa para mim, mas é sempre legal rever essas lições de vez em quando para recordar que são importantes. Destaquei algumas frases, fotografei minhas ilustrações favoritas e me diverti com a leitura, apesar das lições serem, em sua maioria, genéricas.

Tem algumas questões culturais que ficam evidentes no livro, já que se trata de uma obra sul-coreana, e foi interessante percebê-las e traçar paralelos com a nossa própria cultura e realidade.

Você pode ler este livro rapidamente, como eu li, ou pode ler aos poucos, uma ou duas lições por dia para digerir e refletir. De qualquer forma, será uma leitura leve e tranquila.

Título Original: I Decided to Live as Me ✦ Autora: Kim Suhyun
Páginas: 272 ✦ Tradução: Luara França ✦ Editora: Fontanar
Livro recebido em parceria com a editora

28 de agosto de 2025

Terra Partida, de Clare Leslie Hall: o novelão que você pode estar precisando

Eu tenho pensado em Terra Partida como um romance com cara de cult sofisticado, mas que na verdade é uma novelona farofa que consegue unir romance adolescente, drama familiar, treta, briga, confusão, traição e mistério. Eu vi o Paulo Ratz falando que esse livro tem potencial pra agradar todo mundo e é bem isso mesmo, porque Terra Partida tem de tudo.

A cena que dá início aos dramas que vamos acompanhar ao longo do livro mostra o casal Beth e Frank e o irmão de Frank, Jimmy, trabalhando na fazenda do casal quando um cachorro invade suas terras e começa a atacar os cordeiros. Para salvar os animais, Jimmy atira e mata o cão. Eis que entra em cena os donos do cão: Gabriel e seu filhinho Leo. Quem é Gabriel? O ex namorado de Beth, com quem ela viveu um romance juvenil que acabou de forma mal resolvida.

Terra Partida é um desses livros que vai e volta no tempo, nos mostrando todo o desenrolar do relacionamento de Beth com Gabriel até um momento no futuro onde está havendo o julgamento de um suposto assassinato de um fazendeiro que não sabemos quem exatamente é.

Os capítulos do passado mostram o romance de verão intenso e idílico entre os jovens Beth e Gabriel e as dificuldades de torná-lo viável no mundo real, já que os dois são de realidades completamente diferentes. Gabriel é rico e sua mãe tem grandes expectativas para ele, que não incluem, obviamente, se casar com uma menina humilde como Beth.

Os capítulos do presente mostram Beth se reconectando com Gabriel e vendo no filho dele, Leo, o filho que ela perdeu. Já os capítulos no futuro são quase um romance investigativo em que tentamos entender quem morreu, quem matou e porque.

Toda a parte que envolve o filho falecido de Beth e Frank, Bobby, é muito tocante. É perceptível que existe uma grande mágoa entre eles sobre como a morte da criança aconteceu. Só iremos compreender o que de fato aconteceu depois da metade do livro e é devastador. A cena foi tão impactante que me deixou com os olhos marejados.

Terra Partida tem enredo de novela, narrativa de novela e diálogos de novela. O que eu quero dizer com isso? Sabe quando a gente assiste uma novela e cada capítulo te deixa com vontade de ver o próximo? Os acontecimentos são tão mirabolantes e as reviravoltas são tão surpreendentes que você fica preso naquele universo? E você quer muito chegar ao final pra saber as respostas: Quem vai ficar com quem? Quem vai matar quem? E os diálogos são tão apaixonados e as emoções são tão latentes... É isso. Esse livro tem essa vibe.

E é profundamente piegas em muitos momentos, mas de um jeito divertido e envolvente. Os personagens são intensos. Beth ama Gabriel de forma ardente, enquanto Frank ama Beth de uma forma devota, quase como se ela fosse um ser superior. Eles representam coisas diferentes: Gabriel é fogo e aventura, enquanto Frank é segurança e estabilidade. Quem Beth irá escolher? Faz sentido reviver um romance da adolescência já na vida adulta?

E ainda tem outros personagens que são apresentados e explorados no romance. O destaque pra mim é o casal Jimmy e Nina. Jimmy é alcoolista e o romance consegue ser delicado e realista ao apresentar seu problema com o álcool. Já Nina é quase uma fada: vibrante, alegre, colorida e fácil de amar.

Espero ter conseguido passar pra vocês a vibe que esse livro tem: romance estilo novela com muito dramalhão e mistério em cenário rural e com potencial pra curar ressaca literária. ✨️ Recomendo!

Título Original: Broken Country ✦ Autora: Clare Leslie Hall
Páginas: 320 ✦ Tradução: Renato Marques ✦ Editora: Intrínseca
Livro recebido em parceria com a editora
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12 de agosto de 2025

Manual das Donas de Casa Caçadoras de Vampiros, de Grady Hendrix, vale o hype?

Fui uma das pessoas que vibrou com a notícia desse lançamento. Desde que li O Exorcismo da Minha Melhor Amiga e amei, fiquei atenta aos lançamentos do Grady Hendrix no Brasil. E esse foi o mais aguardado, principalmente por conta do Victor Almeida (Geek Freak) que vem panfletando esse livro há muito tempo.

Do Hendrix eu já li O Exorcismo da Minha Melhor Amiga (que amo de paixão), Como Vender Uma Casa Assombrada (que eu, infelizmente, não gostei) e agora esse: Manual das Donas de Casa Caçadoras de Vampiros. Minhas expectativas estavam altas, mesmo com a decepção que tinha sido Como Vender Uma Casa Assombrada. 

E olha, infelizmente, acho que O Exorcismo da Minha Melhor Amiga foi a exceção e não a regra. Mas calma, deixa eu explicar. Manual das Donas de Casa Caçadoras de Vampiros tem exatamente o mesmo problema de Como Vender Uma Casa Assombrada: demora a engatar. Enquanto O Exorcismo da Minha Melhor Amiga é recheado de acontecimentos empolgantes e cenas bizarras, os outros dois livros do autor que eu já li são, na maior parte do tempo, mornos, apesar de suas premissas interessantes.

No livro, somos apresentados a um grupo de mulheres daquelas bem estereotipadas: esposas, mães e donas de casa, num bairro de classe média alta, entediadas e que decidem criar um Clube do Livro para lerem livros sobre crimes e assassinos. E assim o livro segue... e segue... e segue mais um pouco, sem grandes acontecimentos.

Um dia, lá pela página 50, nossa protagonista, Patricia, é atacada por uma senhora no quintal de sua casa e isso dá início aos acontecimentos estranhos da história. Vocês podem estar pensando: "Página 50? Não parece que o livro demora a engatar" Eu sei! Mas depois disso só vai acontecer alguma outra coisa interessante lá pela página 180, quando Patricia vê seu amigo James Harris numa situação perturbadora. 

A gente sabe que é uma história de vampiros, afinal, está no título. Então, é óbvio que eu queria ver vampiros. Só que o livro entrega muito mais convivência familiar e intriguinhas entre mulheres. Assim como aconteceu em Como Vender Uma Casa Assombrada, Manual tinha tudo pra funcionar, mas, pra mim, não funciona.

O livro segue aquele clichê dos livros de thriller protagonizados por mulheres onde uma mulher sabe a verdade, mas é desacreditada e tomado por louca por todos a sua volta. Uma coisa que eu gosto nesse livro é como ele debate temas importantes, como racismo e machismo, de forma sútil e inteligente. Isso também aconteceu em O Exorcismo e parece ser uma característica do autor.

Vi muitas pessoas reclamando do final do livro, mas eu gosto, apesar de ser bastante previsível. Na verdade, eu queria que todo o livro tivesse a vibe que o final tem: com confrontos diretos e muito gore. É um desfecho que me agradou apesar de não ter nada de surpreendente. Se você já leu outros livros do autor, você sabe que seus finais não são inovadores e revolucionários, mas entregam muito sangue.

Meu hanking de livros do Grady Hendrix ficou assim: em primeiro lugar, o meu queridinho O Exorcismo da Minha Melhor Amiga, em segundo lugar Manual das Donas de Casa Caçadoras de Vampiros e, em terceiro lugar, Como Vender Uma Casa Assombrada. No geral, Manual é a típica leitura 3 estrelas, um livro ok, com muito potencial e interessante, mas que decepciona um pouco no desenvolvimento lento.

Título Original: The Southern Book Club's Guide to Slaying Vampires ✦ Autor: Grady Hendrix
Páginas: 432 ✦ Tradução: Ulisses Teixeira ✦ Editora: Intrínseca
Livro recebido em parceria com a editora
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4 de agosto de 2025

Querida Tia: mais um hit da Valérie Perrin?

"2010 é o ano em que minha tia morreu pela segunda vez." declara Agnès, nossa narradora, uma mulher jovem, bem-sucedida, diretora de cinema, mãe, divorciada, que recebe uma estranha ligação a informando sobre o falecimento de sua tia. O problema? A tia de Agnès já havia morrido 3 anos antes. Ou era isso que Agnès achava.

Querida Tia é um romance envolvente que mescla mistério, drama e relações familiares complexas. Foi meu primeiro contato com Valérie Perrin, que já acumula fãs por conta de seus romances anteriores: Água Fresca Para as Flores e Três. Por tudo que eu já tinha ouvido falar, eu já sabia o que esperar: dramas longos e bem detalhados que exploram relações humanas de forma íntima e perspicaz.

E foi realmente isso que eu encontrei: uma narrativa intimista e detalhista que não deixa de lado nenhum personagem. Perrin cria personagens completos: cada um tem personalidade própria, questões pessoais e integridade narrativa.

Nossa narradora, Agnès, lida com o recente divórcio enquanto tenta superar um bloqueio criativo e, pra completar, descobre que a sua tia misteriosa e soturna acaba de morrer... de novo. Agnès sempre achou que Colette era uma mulher de pouca profundidade. Obcecada por futebol, sem marido e sem filhos, a tia Colette era apenas a tia calada que Agnès via todos os anos nas férias.

A pergunta que não quer calar é: Por que Colette fingiu a própria morte? Por que deixou Agnès acreditar que ela estava morta? Por que viveu 3 anos de forma "secreta"? E o que fez nesses 3 anos? Para surpresa de Agnès, quem vai responder essas e outras perguntas é a própria Colette, que gravou mais de 12 mil minutos de fita, guardou numa mala e deixou para Agnès. Quase um diário gravado em voz.

O livro alterna entre o passado de Colette e o presente de Agnès. Ambas as perspectivas foram interessantes. Agnès encontra-se num momento delicado, tentando superar o ex-marido enquanto ouve as fitas da tia e se reencontra com pessoas de seu passado. Porém, não posso negar que conhecer a história da tia Colette foi magnífico. Suas gravações revelam uma mulher complexa e cheia de segredos, marcada por escolhas difíceis, e cuja vida foi entrelaçada por momentos de rebeldia, dor e amor.

A relação de Colette com seu irmão, Jean (o pai de Agnès), é tão doce e cheia de amor que transborda afeto. Colette precisou ser adulta muita cedo, enfrentou pobreza, preconceito e cobranças desproporcionais para a sua idade e fez de tudo para garantir que o irmão pudesse desenvolver seu dom para música.

Mas talvez a personagem mais enigmática desse livro não seja Colette, mas sim Blanche. Não vou entrar em detalhes sobre quem é ela, porque acho que essa é uma das surpresas mais gratificantes desse romance, mas preparem-se para muito mistério, ternura e segredos.

O enredo se desenvolve à medida que Agnès escuta cada fita, revelando segredos de família, episódios dolorosos e verdades encobertas por décadas. A escrita é sensível e a narrativa cria uma sensação constante de descoberta e reconstrução.

Tive algumas oscilações com essa leitura, entre momentos de profundo interesse e momentos de me sentir ligeiramente desconectada da história. Por se tratar de um livro longo, com quase 500 páginas, há alguns capítulos que não me interessaram tanto e eu ficava só desejando que a história voltasse logo para as partes realmente interessantes. Mas, mesmo com essas passagens não tão interessantes (para mim), essa leitura me manteve engajada, principalmente pelo desejo de saber mais sobre a vida de Colette e o que a motivou a fazer o que fez. E o final, realmente, valeu a pena.

Valérie Perrin é, de fato, uma grande contadora de histórias. Sua escrita é profunda e poética e ela mergulha nas histórias, nos personagens e nas relações. As quase 500 páginas de Querida Tia se justificam pelo aprofundamento da história. Cada situação tem início, meio e fim e cada personagem tem personalidade, passado e complexidade. Tudo muito completinho e redondinho.

Por fim, só queria enaltecer a edição da Intrínseca, que está perfeitaaaa. Sabe aquele problema de livros grossos que, para conseguir ler confortavelmente, você acaba tendo que quebrar a lombada? Bom, aqui isso não acontece: o livro abre completamente, é maleável e a diagramação é ótima

Título Original: Tata ✦ Autora: Valérie Perrin
Páginas: 496 ✦ Tradução: Sofia Soter ✦ Editora: Intrínseca
Livro recebido em parceria com a editora

31 de julho de 2025

Dias Perfeitos e os enredos super saturados de Raphael Montes

Recentemente, a editora Companhia das Letras publicou uma "edição de colecionador" de Dias Perfeitos, segundo romance do Raphael Montes e um dos maiores responsáveis pelo sucesso estrondoso do autor, dentro e fora do Brasil. Já li alguns livros do Raphael e aproveitei o relançamento para ler este que eu ainda não tinha lido.

Apesar de não ser uma super fã, eu leio os livros do Raphael Montes, porque geralmente são leituras rápidas e envolventes que despertam curiosidade e surpreendem com os plot twists e as passagens perturbadoras.

A sinopse de Dias Perfeitos não é inovadora. Na verdade, ela já foi bastante explorada em muitas outras histórias. A principal delas: o livro O Colecionador, de John Fowles, publicado em 1963. Confesso que as semelhanças me deixaram até intrigada e me levaram a fazer uma pesquisa rápida na Internet. De fato, encontrei diversas outras pessoas apontando para as semelhanças entre o clássico do suspense de 1963 (que ganhou até uma adaptação em 1965) e o livro do brasileiro.

Polêmicas à parte, vamos à resenha: Dias Perfeitos retrata um jovem estudante de medicina, excêntrico e deficiente em habilidades sociais, que conhece uma jovem vivaz, alegre e descolada, e acaba desenvolvendo uma paixão obsessão por ela. Movido pelo desejo de tê-la só para si, Téo sequestra Clarice com o objetivo de fazê-la se apaixonar por ele. Daí em diante acompanhados os tais "dias perfeitos" que se sucedem. 

O estilo Raphael Montes está presente ao longo de todo o texto: muitas atrocidades são cometidas e muitas minorias são atacadas. As falas capacitistas do Téo são frequentes e, em certo ponto, me fizeram revirar o olho e dizer mentalmente: "Ta bom, Raphael, a gente já entendeu que todos os seus personagens são detestáveis e preconceituosos e esse é o seu jeito de chocar o leitor".

Não sei se o autor continua repetindo essa fórmula em seus lançamentos mais recentes, mas vi isso acontecer em O Vilarejo, em Suicidas e em Jantar Secreto e comecei a achar um pouco cansativo.

Como eu já esperava: foi uma leitura bem rápida. Li praticamente inteiro num único dia, principalmente porque eu estava curiosa pra saber o final (e se seria diferente do final de O Colecionador, já que, até certo ponto, estava tudo igual). Tem uma reviravolta perto do fim que eu amei e me fez pensar: "Uau, se o final for por esse caminho eu vou amar". Mas, infelizmente, não foi o que aconteceu. Resumindo: eu não gostei do desfecho.

Aí veio a surpresa: essa edição traz um final alternativo. Minhas esperanças se renovaram e eu fui ler esperando que esse final fosse o final que eu queria. Não era! kkkkk' O final alternativo é bastante bizarro, mas interessante e coerente com o restante do livro (mas ainda prefiro o final que eu tinha em mente kkkk').

Uma curiosidade legal é que há uma sutil referência à Suicidas, primeiro romance de Montes, no final do livro. Saquei na hora e achei divertido encontrar esse easter egg.

Não foi uma leitura ruim, mas, após ler quatro livros do Raphael Montes, me encontro um pouco saturada. Sinto que a intenção de "chocar a qualquer custo" foi se desgastando e não é mais o suficiente (nunca foi?) para garantir uma boa história. Penso em algumas problemáticas de seus livros, mas nem sei se vale a pena mencionar porque deve fazer parte da fórmula, mas...

Por exemplo: as mulheres de suas histórias são sempre subjugadas, diminuídas, nunca saem por cima em nada e, frequentemente, são estupradas. Mais uma estratégia para chocar ou apenas uma falha na forma como Raphael cria e desenvolve suas personagens femininas? Porque, a impressão que fica é a de que todas as mulheres das suas histórias só estão ali para serem objetos de desejo de seus personagens masculinos (isso acontece em Dias Perfeitos, em Jantar Secreto, em Suicidas e em O Vilarejo).

No geral, eu gosto de histórias bizarras e perturbadoras. Mas acho que elas precisam ser mais do que apenas bizarras e perturbadoras e que não vale tudo pra torná-las bizarras e perturbadoras. Stephen King sabe bem disso depois de tentar chocar com o final de It e ser fortemente criticado.

Não me vejo lendo mais nenhum livro do Raphel Montes no futuro, a menos que alguém me garanta que a fórmula evoluiu. Porque se eu quiser ver mulheres sendo estupradas, pessoas sofrendo gordofobia, homofobia e capacitismo e homens brancos vencendo eu ligo a TV e assisto ao jornal.

Pra ser justa, não quero finalizar essa resenha sem elogiar essa nova edição, que está realmente impecável. Todos os detalhes foram bem pensados. A ilustração da capa, com uma mala de viagem rosa, e a pintura trilateral também rosa fazem alusão à mala de Clarice e dão um toque especial para a edição, que também conta com alguns conteúdos extras que enriquecem a leitura. Pra quem é fã vale muito a pena.

Título Original: Dias Perfeitos ✦ Autor: Raphael Montes
Páginas: 320 ✦ Editora: Companhia das Letras
Livro recebido em parceria com a editora

22 de julho de 2025

Fobia, de Katsunori Hara & Yukiko Goto: um mangá de terror gráfico e perturbador

Fobia é um mangá que contém 5 histórias curtas que retratam diferentes pessoas com diferentes fobias. O primeiro conto se chama Frestas e mostra uma garota com fobia de frestas, como portas entreabertas, bolsas, a fresta do ar condicionado e até as frestas entre pisos. Foi uma ótima história para abrir essa coletânea de contos: bastante gráfica, perturbadora e horripilante. Quem diria que uma história sobre frestas poderia render um final tão chocante?

Duas coisas ficam claras logo nesse primeiro conto: são histórias de terror gráfico e não são indicadas para menores de idade, pois há cenas bem explicitas de sexo.

O segundo conto, denominado Cheiros, retrata outra garota, dessa vez com uma preocupação excessiva e irracional de estar fedendo, principalmente quando na companhia de seu namorado. O final consegue ser tão perturbador quanto o final do primeiro conto, além de ser igualmente gráfico.

Depois que eu peguei o ritmo e entendi o tom dos contos, a leitura fluiu rapidamente. Eu ficava curiosa pra saber qual bizarrice eu encontraria na próxima história e se seria capaz de superar a anterior.

O terceiro conto, Altura, mostra um homem bem-sucedido que está traindo sua mulher com uma garota que tem medo de altura. Inexplicavelmente, o homem começa a sentir um medo absurdo de altura depois que a garota conta pra ele sobre seu medo, como se fosse contagioso. Dentre todos os contos, esse foi o menos perturbador.

Agrupamentos é o nome do quarto conto. Nesse, vemos o surgimento da fobia após uma situação traumática que uma jovem vive ao sair com um garoto que ela conheceu num aplicativo de relacionamentos. Esse conto foi um dos que mais me incomodou, principalmente por envolver uma situação de violência sexual.

O último conto, Lugares Fechados, é uma história de vingança e da fobia que se desenvolve como consequência de ser trancado num lugar pequeno. É interessante, mas não foi a minha preferida. Acho que meus contos preferidos foram os dois primeiros.

Fobia foi uma leitura bem rápida e intrigante. Se você gosta de histórias de terror perturbadoras e inquietantes, esse mangá é perfeito. Eu me surpreendi positivamente com essa leitura, pois gosto desse estilo mais perturbador. E fiquei feliz em saber que esse é o primeiro volume de 3, então em breve terei mais dessas histórias para conhecer.

Título Original: Phobia ✦ Autoria: Katsunori Hara (autor) e Yukiko Goto (desenhista)
Páginas: 200 ✦ Tradução: Caio Suzuki ✦ Editora: JBC
Livro recebido em parceria com a editora
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3 de julho de 2025

Phantasma, de Kaylie Smith, entrega o que promete ou é apenas mais uma romantasia?

Phantasma tinha tudo pra dar certo pra mim: fantasia com elementos sombrios, fantasmas, demônios, uma família de mulheres Necromantes e inteligentes, relação entre irmãs e, de brinde, um hotzinho. E será que conseguiu entregar o que prometeu? Vou fazer esse mistério e dar minha resposta no final da resenha. 👀

A história já começa com a morte da senhora Grimm, mãe de Genevieve e Ophelia, nossa protagonista, deixando as filhas com uma dívida financeira e uma herança mágica que mais parece uma maldição. As coisas se desenrolam de tal forma que ambas as irmãs vão parar em Phantasma, a mansão do diabo onde acontecem competições macabras e sangrentas que podem resultar em prêmios mágicos.

Na mansão, Ophelia conhece Blackwell, um fantasma metido e galanteador que lhe propõe um pacto. Em se tratando de uma romantasia, nós já sabemos que Ophelia e Blackwell viverão um romance. Romance este que renderá muitas cenas picantes ao longo do livro. Algumas muito boas, outras nem tanto.

A maior parte do livro consiste em Ophelia vivendo seus dias em Phantasma, passando pelas fases e pelos desafios que a mansão apresenta, desenvolvendo sua relação com Blackwell, buscando pela irmã e desvendando mistérios. Há questões envolvendo sua própria história e família e também mistérios sobre quem é Blackwell e o que ele precisa para se libertar.

Uma coisa interessante, e que a autora nos alerta logo no início do livro, é que Ophelia apresenta comportamentos obsessivo-compulsivos com muitos pensamentos intrusivos perturbadores. Essa, pra mim, foi uma das partes mais interessantes do livro. Poucas vezes eu vi um romance retratar tão bem o TOC. Ao final, entendemos que esse retrato fiel é decorrente da própria autora ter esse diagnóstico.

Ophelia lida com os demônios de Phantasma e com seus próprios demônios internos, o que faz dela uma personagem bem complexa que, em alguns momentos, cai em alguns clichês dos livros de fantasia, mas nada que tenha atrapalhado a leitura.

Não é a fantasia mais inovadora que eu já li, mas é muuuuito envolvente. O lance da competição é bem batido em livros desse gênero, mas o fato de ser entre demônios e assombrações conseguiu trazer algo de novo. Outro ponto a se considerar é que o livro tem um tom bem juvenil, que não era exatamente o que eu estava esperando.

O que eu mais senti falta foi ver mais do universo fantástico e do sistema de magia. Sinto que passar o livro todo dentro da mansão foi um pouco limitante. Mas, como sabemos que não se trata de um livro único, tenho esperança de ver mais sobre isso na(s) sequência(s).

No início do livro tem uma Hierarquia de Seres Paranormais que inclui Diabo, Demônios, Assombrações, Vampiros, Metamorfos, Familiares, Espíritos, Videntes, Feiticeiras e Espectros, mas quase nada disso é apresentado ou explorado no livro.

Mas, então: valeu a pena? Pra mim, valeu sim. Eu fiquei super envolvida com a história, as competições são interessantes e seguem uma lógica bem definida, o desenrolar da história surpreende, Blackwell é um gostoso querido, os poderes da Ophelia ainda têm muito a entregar e tem uma revelação no final do livro que a gente descobre, mas os personagens não e eu estou super curiosa pra saber como será feita essa revelação pra eles.

Essa leitura era exatamente o que eu estava precisando, uma fantasia simples que serviu entretenimento. Se é isso que você está procurando: recomendo fortemente.

Título Original: Phantasma ✦ Autora: Kaylie Smith
Páginas: 368 ✦ Tradução: Helen Pandolfi ✦ Editora: Intrínseca
Livro recebido em parceria com a editora
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14 de junho de 2025

Imagens Estranhas, um suspense perturbador de Uketsu

Uketsu, fenômeno do terror japonês, chegou ao Brasil por duas editoras diferentes: Casas Estranhas, que eu já li e já resenhei, foi lançado pela Intrínseca, enquanto Imagens Estranhas veio pela Suma. Decidi pegar os dois pra ler no mesmo mês porque queria conhecer logo esse autor que tem feito tanto sucesso, tanto pela qualidade de suas obras, quanto pelo mistério de sua própria identidade, já que ninguém sabe quem ele é, pois sempre que ele aparece, ele está usando uma máscara branca sinistra.

Já quero começar falando sobre a edição brasileira de Imagens Estranhas que está impecável: a capa é linda e tem detalhes em verniz localizado, a parte interna da capa é ilustrada, assim como todo o livro e a diagramação está perfeita. Foi um prazer fazer essa leitura, ao mesmo tempo que eu observava as ilustrações.

A história começa com uma psicóloga e professora universitária mostrando aos alunos um desenho feito por uma criança que matou a própria mãe. Em seguida, somos apresentados a quatro histórias diferentes e todas envolvem desenhos que parecem normais, mas que revelam, aos olhos mais atentos, detalhes obscuros e segredos chocantes.

Um homem posta em seu blog os desenhos que sua mulher fez durante sua gravidez, uma professora mostra a uma mãe o estranho desenho que seu filho fez na escola, um professor de artes deixa um último desenho antes de morrer misteriosamente e uma garotinha pede ao pai um passarinho de estimação.

Essas quatro histórias se ligam paras formar uma única e completa história. E aqui vai o primeiro ponto positivo: normalmente, em livros com histórias que se ligam, essa ligação só fica realmente clara no fim da leitura. Porém, em Imagens Estranhas, isso vai ficando evidente capítulo a capítulo, permitindo que nós, leitores, possamos ligar os pontos aos poucos e de forma constante.

Assim como aconteceu em Casas Estranhas, aqui também a investigação beira o mirabolante em vários momentos e é preciso fazer certa suspensão de descrença e apenas aceitar os caminhos que o autor decide trilhar. Na verdade, essa característica das histórias de Uketsu me lembra muitos os livros de Sherlock Holmes, em que o personagem possui habilidades dedutivas brilhantes e, por vezes, não muito criveis. 

Uma curiosidade é que esse personagem em questão (que faz deduções inacreditáveis) também aparece em Casas Estranhas. Essa é uma tendência forte em livros de investigação e mistério: Agatha Christie tinha seu Poirot, Arthur Conan Doile tinha Sherlock Holmes e Uketsu tem Kurihara.

Eu gostei da leitura, mas o mistério por trás dos desenhos não me prendeu tanto assim. Já próximo do fim do livro eu percebi que não me importava tanto com o desfecho, que a jornada em si é que estava sendo interessante e divertida: observar os desenhos e tentar encontrar as respostas antes delas serem reveladas me manteve na leitura mais do que a resolução em si

Foi uma leitura rápida, mas não tão rápida quanto Casas Estranhas, que é menor e, na minha opinião, um pouco mais fluido. Uma coisa curiosa sobre a esmagadora maioria dos livros japoneses que eu já li é que suas narrativas são muito mais diretas do que a literatura com a qual estamos habituados (livros da América e da Europa, principalmente). Um bom exemplo disso é que, mesmo após ler dois livros com o Kurihara eu sigo sem saber nada sobre ele, apenas que ele tem boas habilidades dedutivas.

Ou seja, Uketsu não nos dá muito contexto e background. Ele vem, conta a história que quer contar e nada além disso. Se você gosta de histórias direto ao ponto, provavelmente você vai gostar. Eu gostei de conhecer o trabalho desse autor, foram leituras intrigantes, rápidas e bem diferentes do que eu estou acostumada.

Uma coisa que eu já havia dito na resenha de Casas Estranhas e que aqui se repetiu foi a questão de eu ter ido esperando terror quando, na verdade, encontrei mistério e investigação. Em Imagens Estranhas isso se repete: apesar da capa e de algumas imagens serem bem perturbadoras, é um livro de investigação para que o leitor brinque de detetive.

No geral, gostei das minhas experiências com Uketsu, mas nada muito memorável. E você, já leu alguma coisa do mascarado?

Título Original: Henna E ✦ Autor: Uketsu
Páginas: 184 ✦ Tradução: Maria Luísa Vanik ✦ Editora: Suma
Livro recebido em parceria com a editora

3 de junho de 2025

Casas Estranhas, um sucesso do misterioso autor japonês Uketsu


Se você gosta de livros de terror e mistério, talvez já tenha ouvido falar em Uketsu, um dos maiores autores de horror do Japão, que também é YouTuber. Uketsu desperta curiosidade entre os leitores, principalmente porque ninguém sabe quem ele é, já que ele sempre aparece com roupas pretas, uma máscara branca e usa efeito para distorcer a voz.

Um de seus maiores sucessos é seu primeiro livro, Casas Estranhas, que chega ao Brasil pela Intrínseca e que eu tive o prazer de ler. A primeira coisa que posso dizer é que foi uma leitura muito rápida. Eu comecei e terminei no mesmo dia. A história contada pelo autor é pontual, com começo, meio e fim e sem contextualizações desnecessárias ou digressões. A gente não sabe praticamente nada sobre os personagens: eles são apenas meios para contar a história que o autor quer contar.

E qual seria essa história? Em Casas Estranhas, um escritor com forte interesse em temas ocultos e um especialista em arquitetura analisam a planta de uma estranha casa. Entre as peculiaridades dessa residência estão: um pequeno espaço entre um cômodo e outro e um quarto infantil sem janelas que só pode ser acessado através do quarto dos pais e só depois de passar por duas portas.

O que essas peculiaridades revelam sobre a casa e sobre seus habitantes? Por que a criança parece estar escondida em um quarto sem janelas? O que realmente há naquele espaço misterioso entre cômodos? É isso que o escritor e o arquiteto tentam investigar e entender, ao maior estilo Sherlock Holmes: com deduções perspicazes e que beiram a adivinhação.

A maior parte do livro são diálogos e isso tornou a leitura muito rápida. Eu me senti sentada na mesa de um café com os personagens, ouvindo eles criarem teorias malucas que explicassem a estranheza das casas e ficando boquiaberta a cada vez que uma teoria insana se mostrava verdadeira.

Eu adorei a fluidez da leitura e a agilidade com que o autor conduz a história, sem enrolações e sem falsas pistas. Bem diferente dos suspenses convencionais onde, a cada página, tudo muda: quem parecia mocinho vira vilão e a gente fica desconfiado até da própria sombra. Se você curte histórias mais lineares, que não ficam tentando te fazer de besta, você vai amar.

Eu confesso que fui esperando um pouco mais de terror, com elementos um pouco mais sobrenaturais. Mas não é bem isso. Então se você não gosta de sentir medo e levar susto, fique tranquilo. Casas Estranhas é aquele tipo de horror que incomoda e gera estranheza, mesmo que a gente não entenda bem o porquê, e não o tipo de horror que dá medo.

A edição da Intrínseca está lindíssima. O livro é todo ilustrado com plantas de casa e uma coisa que eu gostei é que a planta de uma mesma casa reaparece sempre que os personagens estão falando sobre ela. Ou seja, você não vai precisar ficar voltando as páginas a cada vez que um personagem falar sobre algum aspecto da casa (igual mapa em começo de livro). Tem até uma parte da história em que os personagens estão riscando a planta e fazendo modificações e, a cada modificação, a planta reaparece com a alteração, tornando tudo muito fácil de visualizar.

A leitura é realmente rápida, até porque o livro ter cerca de 170 páginas. Gostei e fiquei com vontade de ler mais coisas do autor.

Título Original: Henna Ie ✦ Autor: Uketsu
Páginas: 176 ✦ Tradução: Jefferson José Teixeira ✦ Editora: Intrínseca
Livro recebido em parceria com a editora

9 de maio de 2025

Tudo que eu aprendi atendendo mulheres ansiosas

Oii meninas. Tudo bem?

Eu me chamo Priscila Gatti, sou psicóloga e resenhista aqui do blog desde 2017. Se vocês acompanham o bloguinho, vocês já devem ter visto algumas resenhas minhas por aqui. Inclusive, já resenhei alguns livros de Psicologia.

Mas hoje eu vim divulgar o meu livro. Eu acabei de lançar um e-book onde eu compartilho tudo que eu aprendi atendendo mulheres ansiosas ao longo de 8 anos de Psicologia Clínica. Eu sou uma mulher ansiosa que atende mulheres ansiosas e, ao longo dos anos, aprendi muito sobre a nossa ansiedade.

Você já se sentiu sobrecarregada mesmo quando tudo parecia “em ordem”? Já teve a sensação de que, não importa o quanto se esforce, nunca é suficiente? Já percebeu que sua mente parece nunca parar, como se estivesse sempre tentando antecipar problemas, resolver pendências, agradar todo mundo? Já se sentiu travada frente a tantas demandas e preocupações? Ou já sentiu dificuldade em ficar parada tamanha inquietação causada pela ansiedade?

Tudo isso pode ser ansiedade, em diferentes formas de manifestação. Porque ansiedade não é só aquele nervosismo antes de uma prova ou reunião importante.

E vocês sabiam que mulheres tem quase o dobro de chance de desenvolver transtornos de ansiedade em relação aos homens? No meu e-book, eu exploro os porquês disso, incluindo causas como: pressão social e estética, violência de gênero, jornada dupla, entre outros fatores.

Ao longo desses 8 anos atendendo mulheres, eu identifiquei 6 perfis de mulheres ansiosas e, no meu e-book, eu explico cada um desses perfis e proponho técnicas e estratégias para cada tipo. São mais de 40 técnicas.

Se quiserem saber mais ou tiverem interesse em adquirir, me encontrem no Instagram: @psicologapriscilagatti 

Espero vocês lá. 💛

26 de abril de 2025

A Menina e a Pipa (& a salvadora branca), de Laetitia Colombani


Aceitas uma resenha bem problematizadora hoje? Pois é o que teremos. Prontas? Eu poderia resumir A Menina e a Pipa assim: uma professora francesa de luto resolve fazer algo que os europeus ricos adoram: ir para um país considerado de terceiro mundo para "se curar". No processo, ela descobre que pode, com seu dinheiro e seu conhecimento, ajudar os mais necessitados. O que é ótimo, claro, mas ela faz isso ao estilo europeu: se sentindo a pessoa mais incrível e altruísta do mundo.

Mas vamos começar do começo. A tal francesa se chama Léna e ela passou por uma experiência traumática. De início, o leitor não sabe exatamente o que aconteceu, mas entendemos que Léna perdeu o marido. Abalada e buscando se curar e se reconectar consigo mesma, ela decide passar um tempo vivendo no Golfo de Bengala, na Índia.

Um dia, Léna quase se afoga no mar e é salva por uma menina e uma mulher. Mais tarde, Léna descobre que a mulher em questão é a líder de um grupo local que se intitula Brigada Vermelha: um grupo de mulheres que praticam defesa pessoal e cuidam da segurança das mulheres da região. Toda a parte envolvendo a Brigada Vermelha é muito interessante. Se o livro fosse só sobre isso seria ótimo, mas a europeia não ia aceitar não ser o centro das atenções, né?!

Inclusive, a tal Brigada Vermelha existe mesmo e, pelo que pude checar, todas as informações contidas no livro são reais, incluindo a história de sua fundadora, Usha Vishwakarma, que, em 2016, foi reconhecida como uma das 100 mulheres de maior sucesso da Índia pelo Presidente do país. Segue uma explicação impactante apresentada no livro:

Aqui, o estupro é um esporte nacional, declara a chefe. E os criminosos nunca são castigados: as denúncias raramente levam a investigações, menos ainda quando as vítimas são de classes baixas. Diante da inércia das autoridades, as mulheres precisaram se organizar para garantir a própria segurança.

Léna acaba se aproximando dessas mulheres, que são muito mal vistas pelos locais, e da menina, Lalita, que não fala, mas demonstra um profundo interesse por Léna. Aos poucos, Léna percebe que não só Lalita, mas muitas meninas da região são analfabetas.

Bem-vinda à Índia, murmura. Ali, as meninas não estudam, ou se estudam é por pouco tempo. Não se considera útil educá-las. É preferível mantê-las em casa e ocupá-las com tarefas domésticas, antes de casá-las com alguém assim que atinjam a puberdade.

Léna decide mudar essa triste realidade dando aula para as meninas da região: "Em uma noite mais agitada do que as outras, Léna tem uma ideia. Uma ideia singular, surreal. Construir uma escola em Mahabalipuram."

Tudo muito legal, né?! Mulheres unidas, aprendendo a ler, escrever e lutar. No entanto, na versão de Laetitia, esse grupo de mulheres é liderado, organizado e coordenado por uma francesa bondosa. Quero deixar claro que não há nenhum problema na atitude da personagem. Espero que, na vida real, existam muitas Lénas fazendo coisas parecidas. Mas muito me incomoda a prepotência de criar uma personagem europeia e a retratar de forma quase angelical levando educação a crianças indianas tal qual uma grande salvadora branca.

"Salvador Branco" é um termo sarcástico e crítico que define uma pessoa branca que é descrita como libertadora, salvadora ou edificante para as pessoas não-brancas. Muito retratado na mídia, o salvador branco geralmente surge para resgatar pessoas não-brancas de uma situação de violência ou injustiça, normalmente impondo seus valores e vontades de forma vertical. Também é frequente que o salvador branco seja um branco viajando para um local "exótico".

Muitos filmes já foram criticados por retratarem e enaltecerem salvadores brancos. Entre eles: 12 Anos de Escravidão, Django Livre, Diamante de Sangue, Avatar, Duna, Gran Torino, O Último Samurai e A Grande Muralha. Sobre este último, a atriz Constance Wu fez o seguinte comentário"Temos que parar de perpetuar o mito racista de que apenas um homem branco pode salvar o mundo. Não é baseado em fatos reais. Nossos heróis não se parecem com Matt Damon."

Ouso dizer que os heróis indianos também não se parecem com uma professora francesa traumatizada.

No livro, Léna está constantemente dando ordens às outras mulheres, dizendo o que elas devem ou não fazer. Um trecho específico que me incomodou bastante é quando Léna percebe que as meninas faltam às aulas quando estão menstruadas. O livro explica muito brevemente sobre como a menstruação é um tabu na Índia, mas a resolução é basicamente Léna fazendo as meninas prometerem que não faltarão às aulas quando estiverem menstruadas. Ah, ela também faz um discurso sobre a importância de os panos (que as meninas usam para se limpar e para absorver a menstruação) estarem sempre "cuidadosamente" lavados. Isso tudo logo depois de explicar que "No campo, as escolas não têm banheiro; as meninas precisam se afastar e se esconder na mata para fazer o procedimento. Elas têm vergonha e medo de ser descobertas, até agredidas." Ou seja, um problema complexo sendo solucionado de uma forma simples. A Salvadora Branca ataca novamente.

Não vou mentir: eu não acho que o plot de "encontrar a cura ajudando os outros" seja ruim. É de fato muito poético e tocante ver alguém se curando enquanto ajuda outras pessoas. Mas a forma messiânica como isso é feito é profundamente perturbadora e é difícil acreditar que histórias assim continuam sendo escritas. Vejam esse trecho:

As garotas com quem convive não terão nenhuma outra oportunidade de se educar: a escola é a única escapatória possível da prisão invisível na qual a sociedade deseja trancafiá-las. Léna terá que lutar contra essas correntes. Será preciso enfrentar os perigos, opor-se aos adversários com toda a sua inteligência e a sua determinação. O combate promete ser demorado.

A Léna sendo descrita como uma guerreira solitária lutando sozinha contra os costumes milenares de um país "com toda a sua inteligência e a sua determinação" chega a me dar vergonha.

Pra além de toda essa questão problemática, vale dizer também que o livro carece de profundidade. Em vários momentos, eu achei a narrativa um tanto quanto jornalística: sem emoção, apenas descrições. As intenções da protagonista não ficam claras, porque o livro não se importa em esclarecer seus sentimentos e pensamentos ao leitor.

Antes da metade do livro eu já estava completamente desinteressada e irritada com toda a importância que Léna dá a si mesma e às suas ideias geniais. Mesmo assim, insisti. O final não é de todo ruim. Na verdade, o final traz um tom levemente diferente, mais pessoal, focado na transformação que Léna teve e não na que supostamente causou. Se todo o livro tivesse tido esse tom mais pessoal, de uma pessoa se encontrando e se curando, teria sido muito melhor. O problema foi a insistência em transformar Léna numa heroína branca salvando pessoas não-brancas ao invés de focar apenas no fato de ela ser uma mulher em luto buscando se reconectar consigo mesma e se curar enquanto explora um país novo.

Enfim, se você não for uma chata problematizadora como eu, provavelmente você vai apreciar bem mais essa leitura. Acredito que, se você focar no aspecto pessoal do processo de cura da Léna, a leitura funcionará muito bem. Todo o trabalho de diagramação e tradução da Intrínseca está impecável, como sempre. A capa é linda, a leitura é confortável e eu não encontrei um errinho sequer. 

Título Original: Le cerf-volant ✦ Autora: Laetitia Colombani
Páginas: 192 ✦ Tradução: Sofia Soter ✦ Editora: Intrínseca
Livro recebido em parceria com a editora

14 de abril de 2025

O que a comunidade incel, o thriller Garota Invisível e a série Adolescência da Netflix tem em comum?

Recentemente, o termo incel voltou a ganhar destaque por conta do sucesso da mini série Adolescência da Netflix, que acompanha um adolescente acusado de assassinar uma colega de escola. A série vem sendo muito comentada nas redes sociais, tanto por sua qualidade técnica, já que cada um dos quatro episódios foi filmado em um longo plano sequência, quanto pelos temas que ela aborda e pela forma como mostra que tipo de adolescentes a internet e as redes sociais vêm "criando".

Incel é a junção das palavras involuntário e celibatário. Os incels seriam, portanto, homens heterossexuais que culpam as mulheres e a sociedade pela falta de sucesso romântico e sexual. Na lógica desses homens, as mulheres se tornaram muito exigentes e, por isso, muitos homens não estão obtendo sucesso para encontrar mulheres para se relacionar, frustrando-se e destilando ódio por elas. Para muitos incels, mulheres são privilegiadas, protegidas pelo poder público e altamente seletivas sexualmente. Um incel pode ser desde um jovem virgem, tímido e frustrado, até um homem raivoso e violento que encontra justificativa nessa lógica absurda para abusar de mulheres

Conseguem imaginar a minha surpresa quando peguei pra ler o livro Garota Invisível, lançamento da Intrínseca, e me deparei com o termo incel? Ainda impactada com a série Adolescência, eu mergulhei nessa leitura e finalizei o livro em menos de 24 horas. Garota Invisível é um thriller que aborda o submundo dos fóruns incel da internet.

No livro, acompanhamos três pontos de vista: Saffyre é uma jovem traumatizada que é mandada para a terapia após sua família descobrir que ela se mutila. Cate é uma mulher que vive seus dias tomando conta da casa, dos filhos e do marido (que é o psicólogo de Saffyre). Cate e o marido estão se recuperando de uma crise no casamento. Por último, o terceiro ponto de vista é de Owen, um professor de 33 anos de idade que nunca teve um relacionamento amoroso e que acaba de ser afastado do trabalho por conta de uma acusação feita por suas alunas. Revoltado com a acusação, Owen encontra consolo num fórum incel.

Enquanto Adolescência parece um thriller, mas é um drama, Garota Invisível parece um drama, mas é um thriller. Saffyre irá desaparecer e a investigação envolverá a todos. Thriller está longe de ser meu gênero literário favorito. As fórmulas pré-prontas e replicáveis me incomodam um pouco. Na verdade, quando peguei Garota Invisível pra ler, minha motivação tinha sido o fato de ter um personagem psicólogo. Eu, como psicóloga, adoro ver como minha profissão é retratada na literatura e no cinema. Garota Invisível segue o padrão dos thrillers de ir desenrolando a história aos poucos, mantendo a tensão e revelando informações importantes em momentos estratégicos. 

Apesar de não ser meu tipo favorito de leitura, Garota Invisível conseguiu me envolver rapidamente. Passei horas conversando com meu marido sobre o livro e entrei a madrugada lendo. Saffyre é uma narradora muito interessante. Seus traumas fazem dela uma personagem cheia de camadas e complexidade. Mas meu ponto de vista favorito foi o do Owen, porque ele é um personagem difícil de compreender, principalmente porque nem ele mesmo se compreende. Eu entendo perfeitamente as intenções da autora com esse personagem, mas ainda não tenho uma opinião formada sobre isso. Posso dizer que Lisa Jewell escolheu um caminho perigoso para o personagem (desculpa a frase misteriosa, mas não quero dar spoiler).

A parte que menos gostei do livro foi a resolução do mistério e a conclusão. Achei confusa e desnecessariamente mirabolante (algo que vejo constantemente em thrillers). Mesmo assim, ler esse livro foi uma experiência muito boa, principalmente pelas reflexões que ele propôs, sobre como as aparências enganam, sobre o perigo dos fóruns incels e sobre o risco de nos vermos seduzidos por ideias insanas quando estamos emocionalmente fragilizados.

Adorei a leitura e tenho certeza que é um livro que vai agradar a grande maioria dos leitores. Lisa consegue unir mistério, drama familiar e crítica social numa obra envolvente e coesa. Recomendo!!!

Título Original: Invisible Girl ✦ Autora: Lisa Jewell
Páginas: 384 ✦ Tradução: Karine Ribeiro ✦ Editora: Intrínseca
Livro recebido em parceria com a editora

27 de março de 2025

Mar da Tranquilidade, de Emily St. John Mandel: uma leitura quase 5 estrelas

Vai ser difícil escrever essa resenha, mas vamos lá: vou começar dizendo que a vontade de ler esse livro surgiu depois que o Victor Almeida (Geek Freak) o indicou. Eu gosto das indicações do Victor porque, na maioria das vezes, nossos gostos combinam e as recomendações dele quase sempre funcionam comigo.

Recebi o livro e demoreeeeei pra começar a ler. Não sei explicar o porquê, mas toda vez que eu via o livro em cima da minha mesa, eu simplesmente preferia fazer qualquer outra coisa. Até que, cansada de procrastinar essa tarefa, eu iniciei a leitura. Foi difícil no começo e até procurei resenhas de outras pessoas pra tentar entender o que eu não estava conseguindo captar da história. E o tempo todo pensando: "Victor, você me prometeu!"

Essa dificuldade para me conectar com a história aconteceu principalmente porque não se trata de UMA história, mas de várias, em diferentes lugares e tempos. Começamos acompanhando o jovem Edwin St. Andrew, em 1912. Em seguida, o livro da um salto de 108 anos e nos apresenta outros personagens no ano de 2020. Mais algumas páginas e conhecemos Olive, uma autora em turnê de lançamento de seu novo livro no ano de 2203, quando os humanos já povoaram a lua. Mas é só na parte 4 do romance, que se passa no ano de 2401, que iremos conhecer nosso personagem principal (ou o mais próximo que temos de um personagem principal neste livro), Gaspery. E é só a partir daí que tudo vai fazer sentido, pois há uma estranha experiência que conecta todos esses personagens.

No geral, eu preciso de tempo para me envolver com uma história e fica difícil me vincular quando o livro fica pulando de uma época para outra. Então eu tive que insistir. E valeu muuuuito a pena ter insistido. Não que a história seja 100% original. Na verdade, eu tenho certeza que você, assim como eu, já assistiu ao menos um filme ou leu pelo menos um livro com essa mesma temática. Mas é uma temática tão interessante que não se esgota facilmente. E a autora, Emily St. John Mandel, conseguiu trazer inovação e, principalmente, sentimento pra essa história, com uma pitada de dilemas morais.

Eu sei que estou soando misteriosa e gostaria de poder falar mais sobre minha experiência, mas eu realmente não quero estragar o seu processo de leitura, pois tudo que eu disser a partir daqui será um grande spoiler (apesar da sinopse entregar TUDO). Eu não sou o tipo de leitora que gosta de ficar tentando desvendar os mistérios de um livro. Eu gosto de me deixar levar e de me permitir ser surpreendida na hora que a autora quis que eu me surpreendesse. Isso, na minha opinião, também garantiu que minha experiência de leitura fosse boa, porque eu senti o impacto de cada plot twist. Se você também gosta de se surpreender com o andamento da história enquanto ela acontece, não leia a sinopse do livro. Mas, mesmo lendo a sinopse e sabendo o tema principal, eu garanto que a leitura tem muito mais a oferecer. A revelação final é realmente incrível e muito tocante.

Mas não só de plot twists sobrevive um bom livro, né?! Mar da Tranquilidade também é cheio de reflexões tocantes sobre a vida e as conexões humanas. Eu marquei várias frases e é evidente que a bagagem literária da autora é grande, pois há também várias citações e paráfrases ao longo da história. 

Um personagem que me interessou muito foi o primeiro apresentado no livro: o jovem de 1912. Todos os personagens voltam a aparecer posteriormente e eu aguardei ansiosamente o reaparecimento dele. Fiquei pensando que eu facilmente leria um livro inteiro só sobre ele e sobre tudo que o livro não mostrou da vida dele.

É divertido pensar que todas as respostas estiveram ali o tempo todo e esse é um daqueles livros que você tem vontade de voltar ao início assim que termina de ler, pra tentar ver os sinais que você ignorou na primeira leitura.

Terminei o livro com muitos sentimentos. Não foi uma leitura 5 estrelas pra mim, mas chegou muito perto. A história é muito boa, mas faltou envolvimento. Estranhamente, eu cheguei a conclusão de que faltaram páginas. Eu queria mais dessa história, com mais detalhes, mais desenvolvimento e menos saltos abruptos no tempo. Queria ter me apegado mais aos personagens pra ter me importado mais com as coisas que aconteciam com eles. O livro já tem uma carga emocional forte, mas com mais páginas isso teria sido ainda mais intenso. E digo isso principalmente quanto ao Gaspery. A história dele é linda e comovente, mas suas escolhas e decisões são pouco contextualizadas, simplesmente porque parece que não o conhecemos tão bem e não entendemos seus valores e o que o motiva.

Eu diria que foi uma leitura 4 estrelas, mas favoritada. Vocês favoritam livros que não são 5 estrelas? Pra mim não é tão comum, mas acontece de vez em quando. E aconteceu com Mar da Tranquilidade. Foi uma leitura emocionante e inteligente, mas poderia ter sido ainda melhor se eu tivesse me apegado mais aos personagens.

Título Original: Sea of Tranquility ✦ Autora: Emily St. John Mandel
Páginas: 272 ✦ Tradução: Débora Landsberg ✦ Editora: Intrínseca
Livro recebido em parceria com a editora

20 de março de 2025

Olhe de Novo, de Tali Sharot e Cass R. Sunstein: uma reflexão sobre a capacidade de ser (re)impressionar com o cotidiano


Recentemente, eu, aos 31 anos de idade, viajei de avião pela primeira vez na vida. Durante o voo, enquanto eu olhava pela janela com olhos marejados, vendo as nuvens passando e o solo ficando mais e mais distante, reparei em outros passageiros, claramente habituados com aquela experiência, indiferentes à paisagem. Alguns até mantiveram suas janelas fechadas e passaram a viagem toda sem admirar aquela vista surreal. Por dentro, eu estava gritando: "Você está perdendo isso. Eu sei que você já viajou de avião antes e que isso não é novidade pra você, mas olhe de novo. É lindo! Você precisa ver!"

Olhe de Novo, livro publicado no Brasil em 2025 pela Intrínseca, vai falar justamente sobre isso: a importância de não se habituar completamente, de preservar a capacidade de se maravilhar com o velho e de recuperar a sensibilidade frente àquilo que já virou rotina. Quem não se lembra de uma primeira vez emocionante, né?! A primeira noite na casa nova, o primeiro dia de trabalho naquele emprego tão sonhado, a primeira vez que você ouviu aquela música que se tornou a sua favorita. Nós, leitores, dizemos frequentemente que queríamos "desler" um livro que amamos só para podermos ler de novo pela primeira vez, sentindo todas as emoções e surpresas.

Como psicóloga, muitas vezes eu busco, junto a minhas pacientes, a chamada habituação. Quando lidamos com medos e fobias em terapia, precisamos expor graduadamente o paciente àquilo que o deixa ansioso para, dessa forma, gerarmos um processo de dessenssibilização e habituação. Recentemente, tratei uma jovem com fobia de agulha e foi justamente isso que fizemos (essa história termina com ela colocando um piercing kk'). Por outro lado, como afirmam Sharot e Sunstein, habituar-se a tudo pode ser um problema.

O excesso de habituação pode nos levar a parar de apreciar as belezas da vida comum, os prazeres da rotina e as qualidades de nossos companheiros. Os autores vão ainda mais longe e afirmam que a habituação às coisas ruins também pode ter efeitos negativos. Isso porque, quando nos habituamos a algo ruim, nos desmotivamos a buscar a mudança. Se você se acostuma àquele trabalho ruim ou àquele relacionamento tóxico, você corre o risco de se acomodar. Mas como manter o encantamento com o cotidiano? E como não se acomodar ao que é ruim e nocivo? São essas e outras questões que os autores irão explorar ao longo do livro.

Eu gostei muito dessa leitura e sempre gosto de enaltecer livros com fundo técnico publicados por editoras que não são especialistas nesse tipo de publicação. A Intrínseca, inclusive, tem trazido ótimos títulos voltados para a área da Psicologia, Neurociência e Saúde Mental.

Uma das ideias mais intrigantes do livro é a de que "as coisas boas da vida só vão desencadear uma explosão de alegria se você as tiver de vez em quando". Aposto que você tem vários exemplos disso na prática. Eu, por exemplo, sempre amei Pizza Hut. Na minha cidade não tinha essa franquia, então eu comia sempre que viajava. Era sempre tão bom e tão prazeroso. Então eu me mudei e na minha nova cidade tem Pizza Hut. No início foi um sonho, chegou ao ponto de eu passar uma semana inteira comendo Pizza Hut todos os dias. Adivinhem o que aconteceu? Isso mesmo: eu enjoei. Faz meses que não como Pizza Hut. A conclusão dos autores é interessante: se você quer manter o encantamento, faça pausas, pois "o prazer resulta da satisfação incompleta e intermitente dos desejos".

Ao longo do livro, os autores fazem conexões entre a habituação e a criatividade, a saúde, a avaliação de riscos e a felicidade, além de analisarem eventos históricos e conceitos sociais pela perspectiva da habituação, explorando, por exemplo, a forma como as sociedades se habituam a coisas terríveis, o que eles chamam de habituação das massas.

Olhe de Novo é uma leitura fácil e cheia de insights e reflexões pessoais. Adorei a capa, que é simples, mas brinca com a ideia de limpar os olhos para ver melhor. Recomendo!

Título Original: Look Again ✦ Autores: Tali Sharot e Cass R. Sunstein
Páginas: 240 ✦ Tradução: Cláudia Mello Belhassof ✦ Editora: Intrínseca
Livro recebido em parceria com a editora

17 de março de 2025

Um olhar científico sobre o livro Terapeuta de Bolso, de Annie Zimmerman

Eu já expressei aqui no blog algumas vezes o apreço que eu sinto com o catálogo de livros sobre Psicologia e Saúde Mental da Intrínseca. Sempre que vejo um novo título, especialmente aqueles escritos por profissionais e pesquisadores da área, eu me interesso. Com Terapeuta de Bolso não foi diferente. O livro, escrito pela psicoterapeuta e pesquisadora Annie Zimmerman, promete ajudar as pessoas a se libertarem de velhos padrões e transformarem sua vida. Apesar da promessa um pouco exagerada, a autora realmente conseguiu incluir alguns assuntos interessantes e dicas muito boas.

O livro aborda problemas e desafios pontuais e fornece dicas e estratégias pontuais para lidar com eles. Os capítulos falam sobre temas como depressão, ansiedade, traumas, dependência, relacionamentos, solidão, traição, término e luto. A autora introduz através de histórias de pacientes ficctícios, demonstrando como acontece o trabalho prático do psicoterapeuta. É interessante acompanhar caso a caso, se identificar com os "personagens" e ver como a autora trabalhou cada assunto.

Porém, eu não gostei desse livro tanto quanto eu gostei de outros no mesmo estilo publicados pela editora. De todos os que li recentemente, esse foi o que eu achei menos "científico". Por exemplo, outro título publicado pela Intrínseca que eu li recentemente e também resenhei aqui no blog, chamado Felicidade Não é a Cura, traz conceitos muito bem embasados científicamente, enquanto que este parece mais um amontoado de reflexões, pensamentos e conclusões pessoais.

O perigo das conclusões pessoais é que elas não são verdades científicas e, logo, não servem para todo mundo. E, se estão impressas num livro, muitas pessoas vão achar que as respostas que estão ali são verdades absolutas. Vamos aos exemplos:

Na página 118, a autora afirma que "uma crítica interior é sempre uma crítica exterior que foi internalizada". Não! Apenas não. Uma crítica interior pode ter diversas origens, como comparações, autocobrança excessiva, rigidez cognitiva e, sim, uma crítica exterior que foi internalizada. Mas não se resume a isso.

Na página 156, Annie diz que "relacionamentos fantasiosos são uma defesa contra a intimidade. Enquanto acontecem na nossa cabeça, não estamos arriscando o amor verdadeiro". Fonte? Nenhuma! Fantasiar relações ou idealizar parceiros pode ter diversas causas e pode, inclusive, ter influencias midiátiicas envolvidas. Quem nunca quis viver um relacionamento digno de uma comédia romântica dos anos 2000?

O livro está repleto de declarações deterministas desse tipo e eu me pergunto: como alguém que trabalha com a mente e o comportamento humano pode ter uma visão tão limitada das experiências humanas? Eu tenho 8 anos de atuação como psicoterapeuta e se tem uma coisa que eu aprendi é que nada é simples, nada é preto no branco e toda experiência é subjetiva. Não existe resposta padrão. Não existe solução simples para problemas complexos.

O problema de você achar que tem todas as respostas é que você não se abre para ouvir genuinamente e entender o outro de verdade. Imagina você chegar na terapia, começar a expor seu problema e a psicoterapeuta dizer "É isso!!!!" sem te dar chance de explorar melhor aquilo, sem analisar seu caso de forma individual e subjetiva. Para a autora, tudo que o paciente trás é a "ponta do iceberg" (essa expressão é usada incontáveis vezes). E ela, claro, é quem tem as respostas e sabe o que está no inconsciente do iceberg (vocês não estão vendo, mas estou revirando os olhos agora). 

Mas, por outro lado, o livro também trás algumas (poucas) boas reflexões, como alertar sobre a importância de aceitarmos nossas emoções e sabermos comunicá-las. Pra não citar só trechos horríveis, vou citar um bom aqui. Na página 277, a autora diz que "aprender a confiar nas pessoas tem menos a ver com encontrar alguém que nunca vai nos machucar, e mais a ver com aprender a confiar que seremos capazes de lidar com a situação se elas nos traírem". E sim!! Quando trabalhamos confiança em terapia estamos trabalhando a sua confiança em si mesmo e na sua capacidade de lidar com os problemas e desafios que aparecerem. Não uma confiança cega nos outros, mas uma confiança realista em si mesmo.

Enfim, como psicóloga que adora ler livros de Psicologia, eu infelizmente não gostei desse livro. Tem toda uma questão sobre abordagem psicológica que eu não estou nem um pouco a fim de abordar, porque esse assunto é polêmico. Mas, minha dica é: se você estiver em busca de ajuda psicológica, cuidado com abordagens que não cumprem todos os critérios tradicionalmente exigidos para serem classificadas como ciência.

Título Original: Your Pocket Therapist ✦ Autora: Annie Zimmerman
Páginas: 320 ✦ Tradução: Paula Diniz ✦ Editora: Intrínseca
Livro recebido em parceria com a editora

5 de dezembro de 2024

Intermezzo, de Sally Rooney, e tudo que acontece no interlúdio da vida


Intermezzo significa intervalo, interlúdio ou entreato. É uma palavra italiana muito utilizada no teatro e representa o intervalo entre dois atos. O termo também é utilizado no xadrez e pode indicar um movimento inesperado feito entre duas jogadas esperadas. Com base nisso, é possível fazer alguns inferências sobre o novo livro da Sally Rooney: não é um livro sobre grandes acontecimentos, mas um livro sobre o que acontece no meio, entre os atos principais. E isso fica claro quando descobrimos que o livro se inicia logo após a morte do pai dos protagonistas.

Peter e Ivan são irmãos, mas não se dão bem. Peter é um advogado de 32 anos, bem-sucedido, popular e que se encontra numa situação incomum: tem uma ex-mulher com quem mantém uma amizade próxima e uma ficante que é muito mais jovem do que ele. Ivan, por outro lado, é um jovem de 22 anos, prodígio no xadrez, introvertido e, nas palavras de seu irmão mais velho, "meio autista". Em um dos campeonatos de xadrez que participa, Ivan conhece Margaret, uma mulher bem mais velha com quem ele acaba se envolvendo.

O livro é narrado em terceira pessoa, alternando perspectivas diferentes. E, mais uma vez, assim como acontece em Pessoas Normais, Sally Rooney impressiona por seu estilo narrativo. Muitos acham o estilo de escrita de Rooney soberbo e pedante. Eu compreendo, mas discordo. É tão natural a forma como ela narra que eu não consigo acreditar que seja intencionalmente forçado. Sua narrativa me lembra Proust, com seus parágrafos enormes (alguns com mais de 7 páginas) e descritivos, e Virgínia Woolf, com seu fluxo de consciência que radicaliza o monólogo interior.

Sally narra tudo de uma vez, tudo junto, descrições de cena, pensamentos, sentimentos e diálogos. Seus diálogos, principalmente, geram opiniões divergentes. Sem parágrafo, travessão, sem aspas, nada que indique que aquilo seja uma fala de um personagem. E mesmo assim, tão fácil de compreender. Tão intuitivo. Foi o mesmo que eu senti em Pessoas Normais, que ela não precisava sinalizar os diálogos, pois eles se sinalizavam por conta própria.

Dizer que o livro é narrado em terceira pessoa pode causar uma impressão errada. Normalmente, livros narrados em terceira pessoa são mais impessoais e objetivos. Em Intermezzo, essa narrativa em terceira pessoa se mescla aos pensamentos dos personagens, fazendo com que a narrativa, em alguns momentos, seja em primeira pessoa.

Isso acontece principalmente nos capítulos do Peter. A narrativa traduz com maestria o estado emocional do personagem, confuso, perdido e caótico. Mais do que isso, a narrativa parece incorporar diferentes vozes presentes na mente de Peter, com pensamentos que se contradizem e ideias que são em seguida confrontadas. Os capítulos do Ivan são um pouco mais objetivos, ainda que também carreguem carga emocional.


A história se desenrola assim: Ivan e Peter, vivendo suas vidas, tendo poucas interações diretas, mas pensando e falando um do outro com frequência. De certa forma, a autora se utilizou de um recurso que ela já havia usado em Pessoas Normais: a falta de diálogo como base dos conflitos interpessoais. No entanto, eu achei que em Intermezzo isso ficou ainda mais realista, porque além de faltar diálogo, quando ele ocorre ele é atravessado, atropelado e acidentado. Há tanta mágoa, rancor, raiva, vergonha, arrependimento e ainda o luto pela perda do pai que, mesmo quando Peter e Ivan conversam, o que sai de suas bocas é improdutivo e conflituoso. Também é curioso que os irmãos interajam tão pouco ao longo do livro e que, mesmo assim, estejam tão presentes na vida um do outro.

Cada um tem uma opinião sobre o que acha que o outro pensa e a gente, que conhece os dois lados, fica numa ânsia de fazê-los entender que "SEU IRMÃO NÃO PENSA ISSO DE VOCÊ", ansiando pelo momento em que eles irão cair na real. Isso se der tempo de eles caírem na real. O livro todo carrega uma tensão sobre o que vai acontecer. Isso se dá principalmente porque Peter tem muitos pensamentos suicidas, desde o início do livro e a constante ameaça de um suicídio faz o leitor se perguntar quanto tempo ainda existe para que os irmãos se acertem.


Eu sou o tipo de leitora que adora odiar personagens, enquanto a Sally Rooney é o tipo de autora que adora criar personagens detestáveis. Então a gente combina bem. Todos os personagens aqui são fáceis de odiar, ao mesmo tempo que é fácil se identificar com eles. É fácil se identificar com a soberba do Peter e com o egoísmo do Ivan. As mulheres dessa história, por outro lado, são incríveis, mesmo que também tenham defeitos. Sylvia, ex-mulher de Peter, é doce e inteligente. Naomi, sua namorada, é vivaz e selvagem. Mas a minha favorita foi a Margaret, centrada e compreensiva. Nas palavras de Ivan: "ela entende tudo".

Particularmente, eu gostei mais do Ivan. Sua personalidade introspectiva e inocente me conquistou. No entanto, os capítulos do Peter foram os meus preferidos, pois tinham uma carga psicológica maior. Eu confesso que comprei um lado nessa história desde o começo, mas Sally foi capaz de me surpreender ao me provar que, na maioria das vezes, não existe certo ou errado quando estamos falando de relações humanas. Ambos, Peter e Ivan, erraram. Alguns erros foram piores que outros, mas não deixam de ser erros. Eu me emocionei em muitos momentos do livro. As reflexões sobre o sentido da vida (ou a ausência dele) foram muito tocantes pra mim. O final também foi muito comovente e até me arrancou uma lágrima discreta. 

Mas não pensem que o livro é só reflexão e filosofia, pois tem muito mais do que isso, tem romance, inclusive com cenas hot, tem brigas, inclusive com pancadaria, tem muita discussão, ofensa, "vai se f...." e tudo mais. Eu amei amei amei, de verdade. Vou sentir falta dos personagens, que pareceram tão reais. Ao final do livro, a autora incluiu uma lista de citações e referências que ela utilizou em seu texto. Fica evidente que Sally tem uma bagagem grande de leituras e conhecimento. Terminei essa leitura com vontade de ler outro livro da Sally, já que, antes desse, eu só havia lido Pessoas Normais. Estou realmente apaixonada pela escrita da autora.

Por fim, gostaria de enaltecer o trabalho da equipe editorial da Companhia das Letras, especialmente da tradutora, Débora Landsberg. Eu imagino que traduzir um texto com tanto fluxo de consciência não deva ser uma tarefa fácil.

Título Original: Intermezzo ✦ Autora: Sally Rooney
Páginas: 456 ✦ Tradução: Débora Landsberg ✦ Editora: Companhia das Letras
Livro recebido em parceria com a editora