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11 de setembro de 2025
No Meio da Noite, de Riley Sager: um dos melhores thrillers dos últimos tempos
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4 de setembro de 2025
Decidi Viver Como Eu Mesma: lições de Kim Suhyun para uma vida mais leve e autêntica
Decidi Viver Como Eu Mesma é aquele tipo de livro rápido, com textos curtos e reflexivos que trazem lições de vida. No geral, eu gosto de livros assim, mas acho difícil encontrar algum que realmente traga algo de novo e não diga apenas o que outros 10 livros desse mesmo tipo já disseram.
Mas como fazer isso na prática? Kim guia o leitor através de mais de 60 lições que incluem, por exemplo: Não seja modesto a ponto de afetar a sua autoestima, Desenvolva seu estilo pessoal, Não siga um roteiro aleatório, Expresse seus sentimentos, Seja generoso e Deixe espaço para o erro.
Cada lição vem acompanhada de um pequeno texto onde a autora dá exemplos pessoais ou conta casos que ilustrem aquela lição. A maioria das lições também vem acompanhada de uma ilustração fofa que torna a leitura ainda mais leve e divertida.
Minha experiência com essa leitura foi agradável, mas não transformadora. Não teve nenhuma lição que tenha sido super inovadora ou grandiosa para mim, mas é sempre legal rever essas lições de vez em quando para recordar que são importantes. Destaquei algumas frases, fotografei minhas ilustrações favoritas e me diverti com a leitura, apesar das lições serem, em sua maioria, genéricas.
Tem algumas questões culturais que ficam evidentes no livro, já que se trata de uma obra sul-coreana, e foi interessante percebê-las e traçar paralelos com a nossa própria cultura e realidade.
Você pode ler este livro rapidamente, como eu li, ou pode ler aos poucos, uma ou duas lições por dia para digerir e refletir. De qualquer forma, será uma leitura leve e tranquila.
28 de agosto de 2025
Terra Partida, de Clare Leslie Hall: o novelão que você pode estar precisando
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12 de agosto de 2025
Manual das Donas de Casa Caçadoras de Vampiros, de Grady Hendrix, vale o hype?
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4 de agosto de 2025
Querida Tia: mais um hit da Valérie Perrin?
"2010 é o ano em que minha tia morreu pela segunda vez." declara Agnès, nossa narradora, uma mulher jovem, bem-sucedida, diretora de cinema, mãe, divorciada, que recebe uma estranha ligação a informando sobre o falecimento de sua tia. O problema? A tia de Agnès já havia morrido 3 anos antes. Ou era isso que Agnès achava.
Querida Tia é um romance envolvente que mescla mistério, drama e relações familiares complexas. Foi meu primeiro contato com Valérie Perrin, que já acumula fãs por conta de seus romances anteriores: Água Fresca Para as Flores e Três. Por tudo que eu já tinha ouvido falar, eu já sabia o que esperar: dramas longos e bem detalhados que exploram relações humanas de forma íntima e perspicaz.
E foi realmente isso que eu encontrei: uma narrativa intimista e detalhista que não deixa de lado nenhum personagem. Perrin cria personagens completos: cada um tem personalidade própria, questões pessoais e integridade narrativa.
Nossa narradora, Agnès, lida com o recente divórcio enquanto tenta superar um bloqueio criativo e, pra completar, descobre que a sua tia misteriosa e soturna acaba de morrer... de novo. Agnès sempre achou que Colette era uma mulher de pouca profundidade. Obcecada por futebol, sem marido e sem filhos, a tia Colette era apenas a tia calada que Agnès via todos os anos nas férias.
A pergunta que não quer calar é: Por que Colette fingiu a própria morte? Por que deixou Agnès acreditar que ela estava morta? Por que viveu 3 anos de forma "secreta"? E o que fez nesses 3 anos? Para surpresa de Agnès, quem vai responder essas e outras perguntas é a própria Colette, que gravou mais de 12 mil minutos de fita, guardou numa mala e deixou para Agnès. Quase um diário gravado em voz.
O livro alterna entre o passado de Colette e o presente de Agnès. Ambas as perspectivas foram interessantes. Agnès encontra-se num momento delicado, tentando superar o ex-marido enquanto ouve as fitas da tia e se reencontra com pessoas de seu passado. Porém, não posso negar que conhecer a história da tia Colette foi magnífico. Suas gravações revelam uma mulher complexa e cheia de segredos, marcada por escolhas difíceis, e cuja vida foi entrelaçada por momentos de rebeldia, dor e amor.
A relação de Colette com seu irmão, Jean (o pai de Agnès), é tão doce e cheia de amor que transborda afeto. Colette precisou ser adulta muita cedo, enfrentou pobreza, preconceito e cobranças desproporcionais para a sua idade e fez de tudo para garantir que o irmão pudesse desenvolver seu dom para música.
Mas talvez a personagem mais enigmática desse livro não seja Colette, mas sim Blanche. Não vou entrar em detalhes sobre quem é ela, porque acho que essa é uma das surpresas mais gratificantes desse romance, mas preparem-se para muito mistério, ternura e segredos.
O enredo se desenvolve à medida que Agnès escuta cada fita, revelando segredos de família, episódios dolorosos e verdades encobertas por décadas. A escrita é sensível e a narrativa cria uma sensação constante de descoberta e reconstrução.
Tive algumas oscilações com essa leitura, entre momentos de profundo interesse e momentos de me sentir ligeiramente desconectada da história. Por se tratar de um livro longo, com quase 500 páginas, há alguns capítulos que não me interessaram tanto e eu ficava só desejando que a história voltasse logo para as partes realmente interessantes. Mas, mesmo com essas passagens não tão interessantes (para mim), essa leitura me manteve engajada, principalmente pelo desejo de saber mais sobre a vida de Colette e o que a motivou a fazer o que fez. E o final, realmente, valeu a pena.
Valérie Perrin é, de fato, uma grande contadora de histórias. Sua escrita é profunda e poética e ela mergulha nas histórias, nos personagens e nas relações. As quase 500 páginas de Querida Tia se justificam pelo aprofundamento da história. Cada situação tem início, meio e fim e cada personagem tem personalidade, passado e complexidade. Tudo muito completinho e redondinho.
Por fim, só queria enaltecer a edição da Intrínseca, que está perfeitaaaa. Sabe aquele problema de livros grossos que, para conseguir ler confortavelmente, você acaba tendo que quebrar a lombada? Bom, aqui isso não acontece: o livro abre completamente, é maleável e a diagramação é ótima.
31 de julho de 2025
Dias Perfeitos e os enredos super saturados de Raphael Montes
Recentemente, a editora Companhia das Letras publicou uma "edição de colecionador" de Dias Perfeitos, segundo romance do Raphael Montes e um dos maiores responsáveis pelo sucesso estrondoso do autor, dentro e fora do Brasil. Já li alguns livros do Raphael e aproveitei o relançamento para ler este que eu ainda não tinha lido.
Apesar de não ser uma super fã, eu leio os livros do Raphael Montes, porque geralmente são leituras rápidas e envolventes que despertam curiosidade e surpreendem com os plot twists e as passagens perturbadoras.
A sinopse de Dias Perfeitos não é inovadora. Na verdade, ela já foi bastante explorada em muitas outras histórias. A principal delas: o livro O Colecionador, de John Fowles, publicado em 1963. Confesso que as semelhanças me deixaram até intrigada e me levaram a fazer uma pesquisa rápida na Internet. De fato, encontrei diversas outras pessoas apontando para as semelhanças entre o clássico do suspense de 1963 (que ganhou até uma adaptação em 1965) e o livro do brasileiro.
Polêmicas à parte, vamos à resenha: Dias Perfeitos retrata um jovem estudante de medicina, excêntrico e deficiente em habilidades sociais, que conhece uma jovem vivaz, alegre e descolada, e acaba desenvolvendo uma paixão obsessão por ela. Movido pelo desejo de tê-la só para si, Téo sequestra Clarice com o objetivo de fazê-la se apaixonar por ele. Daí em diante acompanhados os tais "dias perfeitos" que se sucedem.
O estilo Raphael Montes está presente ao longo de todo o texto: muitas atrocidades são cometidas e muitas minorias são atacadas. As falas capacitistas do Téo são frequentes e, em certo ponto, me fizeram revirar o olho e dizer mentalmente: "Ta bom, Raphael, a gente já entendeu que todos os seus personagens são detestáveis e preconceituosos e esse é o seu jeito de chocar o leitor".
Não sei se o autor continua repetindo essa fórmula em seus lançamentos mais recentes, mas vi isso acontecer em O Vilarejo, em Suicidas e em Jantar Secreto e comecei a achar um pouco cansativo.
Como eu já esperava: foi uma leitura bem rápida. Li praticamente inteiro num único dia, principalmente porque eu estava curiosa pra saber o final (e se seria diferente do final de O Colecionador, já que, até certo ponto, estava tudo igual). Tem uma reviravolta perto do fim que eu amei e me fez pensar: "Uau, se o final for por esse caminho eu vou amar". Mas, infelizmente, não foi o que aconteceu. Resumindo: eu não gostei do desfecho.
Aí veio a surpresa: essa edição traz um final alternativo. Minhas esperanças se renovaram e eu fui ler esperando que esse final fosse o final que eu queria. Não era! kkkkk' O final alternativo é bastante bizarro, mas interessante e coerente com o restante do livro (mas ainda prefiro o final que eu tinha em mente kkkk').
Uma curiosidade legal é que há uma sutil referência à Suicidas, primeiro romance de Montes, no final do livro. Saquei na hora e achei divertido encontrar esse easter egg.
Não foi uma leitura ruim, mas, após ler quatro livros do Raphael Montes, me encontro um pouco saturada. Sinto que a intenção de "chocar a qualquer custo" foi se desgastando e não é mais o suficiente (nunca foi?) para garantir uma boa história. Penso em algumas problemáticas de seus livros, mas nem sei se vale a pena mencionar porque deve fazer parte da fórmula, mas...
Por exemplo: as mulheres de suas histórias são sempre subjugadas, diminuídas, nunca saem por cima em nada e, frequentemente, são estupradas. Mais uma estratégia para chocar ou apenas uma falha na forma como Raphael cria e desenvolve suas personagens femininas? Porque, a impressão que fica é a de que todas as mulheres das suas histórias só estão ali para serem objetos de desejo de seus personagens masculinos (isso acontece em Dias Perfeitos, em Jantar Secreto, em Suicidas e em O Vilarejo).
No geral, eu gosto de histórias bizarras e perturbadoras. Mas acho que elas precisam ser mais do que apenas bizarras e perturbadoras e que não vale tudo pra torná-las bizarras e perturbadoras. Stephen King sabe bem disso depois de tentar chocar com o final de It e ser fortemente criticado.
Não me vejo lendo mais nenhum livro do Raphel Montes no futuro, a menos que alguém me garanta que a fórmula evoluiu. Porque se eu quiser ver mulheres sendo estupradas, pessoas sofrendo gordofobia, homofobia e capacitismo e homens brancos vencendo eu ligo a TV e assisto ao jornal.
Pra ser justa, não quero finalizar essa resenha sem elogiar essa nova edição, que está realmente impecável. Todos os detalhes foram bem pensados. A ilustração da capa, com uma mala de viagem rosa, e a pintura trilateral também rosa fazem alusão à mala de Clarice e dão um toque especial para a edição, que também conta com alguns conteúdos extras que enriquecem a leitura. Pra quem é fã vale muito a pena.
22 de julho de 2025
Fobia, de Katsunori Hara & Yukiko Goto: um mangá de terror gráfico e perturbador
Fobia é um mangá que contém 5 histórias curtas que retratam diferentes pessoas com diferentes fobias. O primeiro conto se chama Frestas e mostra uma garota com fobia de frestas, como portas entreabertas, bolsas, a fresta do ar condicionado e até as frestas entre pisos. Foi uma ótima história para abrir essa coletânea de contos: bastante gráfica, perturbadora e horripilante. Quem diria que uma história sobre frestas poderia render um final tão chocante?
Duas coisas ficam claras logo nesse primeiro conto: são histórias de terror gráfico e não são indicadas para menores de idade, pois há cenas bem explicitas de sexo.
O segundo conto, denominado Cheiros, retrata outra garota, dessa vez com uma preocupação excessiva e irracional de estar fedendo, principalmente quando na companhia de seu namorado. O final consegue ser tão perturbador quanto o final do primeiro conto, além de ser igualmente gráfico.
Depois que eu peguei o ritmo e entendi o tom dos contos, a leitura fluiu rapidamente. Eu ficava curiosa pra saber qual bizarrice eu encontraria na próxima história e se seria capaz de superar a anterior.
O terceiro conto, Altura, mostra um homem bem-sucedido que está traindo sua mulher com uma garota que tem medo de altura. Inexplicavelmente, o homem começa a sentir um medo absurdo de altura depois que a garota conta pra ele sobre seu medo, como se fosse contagioso. Dentre todos os contos, esse foi o menos perturbador.
Agrupamentos é o nome do quarto conto. Nesse, vemos o surgimento da fobia após uma situação traumática que uma jovem vive ao sair com um garoto que ela conheceu num aplicativo de relacionamentos. Esse conto foi um dos que mais me incomodou, principalmente por envolver uma situação de violência sexual.
O último conto, Lugares Fechados, é uma história de vingança e da fobia que se desenvolve como consequência de ser trancado num lugar pequeno. É interessante, mas não foi a minha preferida. Acho que meus contos preferidos foram os dois primeiros.
Fobia foi uma leitura bem rápida e intrigante. Se você gosta de histórias de terror perturbadoras e inquietantes, esse mangá é perfeito. Eu me surpreendi positivamente com essa leitura, pois gosto desse estilo mais perturbador. E fiquei feliz em saber que esse é o primeiro volume de 3, então em breve terei mais dessas histórias para conhecer.
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3 de julho de 2025
Phantasma, de Kaylie Smith, entrega o que promete ou é apenas mais uma romantasia?
Phantasma tinha tudo pra dar certo pra mim: fantasia com elementos sombrios, fantasmas, demônios, uma família de mulheres Necromantes e inteligentes, relação entre irmãs e, de brinde, um hotzinho. E será que conseguiu entregar o que prometeu? Vou fazer esse mistério e dar minha resposta no final da resenha. 👀
A história já começa com a morte da senhora Grimm, mãe de Genevieve e Ophelia, nossa protagonista, deixando as filhas com uma dívida financeira e uma herança mágica que mais parece uma maldição. As coisas se desenrolam de tal forma que ambas as irmãs vão parar em Phantasma, a mansão do diabo onde acontecem competições macabras e sangrentas que podem resultar em prêmios mágicos.
Na mansão, Ophelia conhece Blackwell, um fantasma metido e galanteador que lhe propõe um pacto. Em se tratando de uma romantasia, nós já sabemos que Ophelia e Blackwell viverão um romance. Romance este que renderá muitas cenas picantes ao longo do livro. Algumas muito boas, outras nem tanto.
A maior parte do livro consiste em Ophelia vivendo seus dias em Phantasma, passando pelas fases e pelos desafios que a mansão apresenta, desenvolvendo sua relação com Blackwell, buscando pela irmã e desvendando mistérios. Há questões envolvendo sua própria história e família e também mistérios sobre quem é Blackwell e o que ele precisa para se libertar.
Uma coisa interessante, e que a autora nos alerta logo no início do livro, é que Ophelia apresenta comportamentos obsessivo-compulsivos com muitos pensamentos intrusivos perturbadores. Essa, pra mim, foi uma das partes mais interessantes do livro. Poucas vezes eu vi um romance retratar tão bem o TOC. Ao final, entendemos que esse retrato fiel é decorrente da própria autora ter esse diagnóstico.
Ophelia lida com os demônios de Phantasma e com seus próprios demônios internos, o que faz dela uma personagem bem complexa que, em alguns momentos, cai em alguns clichês dos livros de fantasia, mas nada que tenha atrapalhado a leitura.
Não é a fantasia mais inovadora que eu já li, mas é muuuuito envolvente. O lance da competição é bem batido em livros desse gênero, mas o fato de ser entre demônios e assombrações conseguiu trazer algo de novo. Outro ponto a se considerar é que o livro tem um tom bem juvenil, que não era exatamente o que eu estava esperando.
O que eu mais senti falta foi ver mais do universo fantástico e do sistema de magia. Sinto que passar o livro todo dentro da mansão foi um pouco limitante. Mas, como sabemos que não se trata de um livro único, tenho esperança de ver mais sobre isso na(s) sequência(s).
No início do livro tem uma Hierarquia de Seres Paranormais que inclui Diabo, Demônios, Assombrações, Vampiros, Metamorfos, Familiares, Espíritos, Videntes, Feiticeiras e Espectros, mas quase nada disso é apresentado ou explorado no livro.
Mas, então: valeu a pena? Pra mim, valeu sim. Eu fiquei super envolvida com a história, as competições são interessantes e seguem uma lógica bem definida, o desenrolar da história surpreende, Blackwell é um gostoso querido, os poderes da Ophelia ainda têm muito a entregar e tem uma revelação no final do livro que a gente descobre, mas os personagens não e eu estou super curiosa pra saber como será feita essa revelação pra eles.
Essa leitura era exatamente o que eu estava precisando, uma fantasia simples que serviu entretenimento. Se é isso que você está procurando: recomendo fortemente.
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14 de junho de 2025
Imagens Estranhas, um suspense perturbador de Uketsu
Uketsu, fenômeno do terror japonês, chegou ao Brasil por duas editoras diferentes: Casas Estranhas, que eu já li e já resenhei, foi lançado pela Intrínseca, enquanto Imagens Estranhas veio pela Suma. Decidi pegar os dois pra ler no mesmo mês porque queria conhecer logo esse autor que tem feito tanto sucesso, tanto pela qualidade de suas obras, quanto pelo mistério de sua própria identidade, já que ninguém sabe quem ele é, pois sempre que ele aparece, ele está usando uma máscara branca sinistra.
Já quero começar falando sobre a edição brasileira de Imagens Estranhas que está impecável: a capa é linda e tem detalhes em verniz localizado, a parte interna da capa é ilustrada, assim como todo o livro e a diagramação está perfeita. Foi um prazer fazer essa leitura, ao mesmo tempo que eu observava as ilustrações.
A história começa com uma psicóloga e professora universitária mostrando aos alunos um desenho feito por uma criança que matou a própria mãe. Em seguida, somos apresentados a quatro histórias diferentes e todas envolvem desenhos que parecem normais, mas que revelam, aos olhos mais atentos, detalhes obscuros e segredos chocantes.
Um homem posta em seu blog os desenhos que sua mulher fez durante sua gravidez, uma professora mostra a uma mãe o estranho desenho que seu filho fez na escola, um professor de artes deixa um último desenho antes de morrer misteriosamente e uma garotinha pede ao pai um passarinho de estimação.
Essas quatro histórias se ligam paras formar uma única e completa história. E aqui vai o primeiro ponto positivo: normalmente, em livros com histórias que se ligam, essa ligação só fica realmente clara no fim da leitura. Porém, em Imagens Estranhas, isso vai ficando evidente capítulo a capítulo, permitindo que nós, leitores, possamos ligar os pontos aos poucos e de forma constante.
Assim como aconteceu em Casas Estranhas, aqui também a investigação beira o mirabolante em vários momentos e é preciso fazer certa suspensão de descrença e apenas aceitar os caminhos que o autor decide trilhar. Na verdade, essa característica das histórias de Uketsu me lembra muitos os livros de Sherlock Holmes, em que o personagem possui habilidades dedutivas brilhantes e, por vezes, não muito criveis.
Uma curiosidade é que esse personagem em questão (que faz deduções inacreditáveis) também aparece em Casas Estranhas. Essa é uma tendência forte em livros de investigação e mistério: Agatha Christie tinha seu Poirot, Arthur Conan Doile tinha Sherlock Holmes e Uketsu tem Kurihara.
Eu gostei da leitura, mas o mistério por trás dos desenhos não me prendeu tanto assim. Já próximo do fim do livro eu percebi que não me importava tanto com o desfecho, que a jornada em si é que estava sendo interessante e divertida: observar os desenhos e tentar encontrar as respostas antes delas serem reveladas me manteve na leitura mais do que a resolução em si.
Foi uma leitura rápida, mas não tão rápida quanto Casas Estranhas, que é menor e, na minha opinião, um pouco mais fluido. Uma coisa curiosa sobre a esmagadora maioria dos livros japoneses que eu já li é que suas narrativas são muito mais diretas do que a literatura com a qual estamos habituados (livros da América e da Europa, principalmente). Um bom exemplo disso é que, mesmo após ler dois livros com o Kurihara eu sigo sem saber nada sobre ele, apenas que ele tem boas habilidades dedutivas.
Ou seja, Uketsu não nos dá muito contexto e background. Ele vem, conta a história que quer contar e nada além disso. Se você gosta de histórias direto ao ponto, provavelmente você vai gostar. Eu gostei de conhecer o trabalho desse autor, foram leituras intrigantes, rápidas e bem diferentes do que eu estou acostumada.
Uma coisa que eu já havia dito na resenha de Casas Estranhas e que aqui se repetiu foi a questão de eu ter ido esperando terror quando, na verdade, encontrei mistério e investigação. Em Imagens Estranhas isso se repete: apesar da capa e de algumas imagens serem bem perturbadoras, é um livro de investigação para que o leitor brinque de detetive.
No geral, gostei das minhas experiências com Uketsu, mas nada muito memorável. E você, já leu alguma coisa do mascarado?
3 de junho de 2025
Casas Estranhas, um sucesso do misterioso autor japonês Uketsu
9 de maio de 2025
Tudo que eu aprendi atendendo mulheres ansiosas
Oii meninas. Tudo bem?
Eu me chamo Priscila Gatti, sou psicóloga e resenhista aqui do blog desde 2017. Se vocês acompanham o bloguinho, vocês já devem ter visto algumas resenhas minhas por aqui. Inclusive, já resenhei alguns livros de Psicologia.
Mas hoje eu vim divulgar o meu livro. Eu acabei de lançar um e-book onde eu compartilho tudo que eu aprendi atendendo mulheres ansiosas ao longo de 8 anos de Psicologia Clínica. Eu sou uma mulher ansiosa que atende mulheres ansiosas e, ao longo dos anos, aprendi muito sobre a nossa ansiedade.
Você já se sentiu sobrecarregada mesmo quando tudo parecia “em ordem”? Já teve a sensação de que, não importa o quanto se esforce, nunca é suficiente? Já percebeu que sua mente parece nunca parar, como se estivesse sempre tentando antecipar problemas, resolver pendências, agradar todo mundo? Já se sentiu travada frente a tantas demandas e preocupações? Ou já sentiu dificuldade em ficar parada tamanha inquietação causada pela ansiedade?
Tudo isso pode ser ansiedade, em diferentes formas de manifestação. Porque ansiedade não é só aquele nervosismo antes de uma prova ou reunião importante.
E vocês sabiam que mulheres tem quase o dobro de chance de desenvolver transtornos de ansiedade em relação aos homens? No meu e-book, eu exploro os porquês disso, incluindo causas como: pressão social e estética, violência de gênero, jornada dupla, entre outros fatores.
Ao longo desses 8 anos atendendo mulheres, eu identifiquei 6 perfis de mulheres ansiosas e, no meu e-book, eu explico cada um desses perfis e proponho técnicas e estratégias para cada tipo. São mais de 40 técnicas.
Se quiserem saber mais ou tiverem interesse em adquirir, me encontrem no Instagram: @psicologapriscilagatti
Espero vocês lá. 💛
26 de abril de 2025
A Menina e a Pipa (& a salvadora branca), de Laetitia Colombani
Aqui, o estupro é um esporte nacional, declara a chefe. E os criminosos nunca são castigados: as denúncias raramente levam a investigações, menos ainda quando as vítimas são de classes baixas. Diante da inércia das autoridades, as mulheres precisaram se organizar para garantir a própria segurança.
Bem-vinda à Índia, murmura. Ali, as meninas não estudam, ou se estudam é por pouco tempo. Não se considera útil educá-las. É preferível mantê-las em casa e ocupá-las com tarefas domésticas, antes de casá-las com alguém assim que atinjam a puberdade.
As garotas com quem convive não terão nenhuma outra oportunidade de se educar: a escola é a única escapatória possível da prisão invisível na qual a sociedade deseja trancafiá-las. Léna terá que lutar contra essas correntes. Será preciso enfrentar os perigos, opor-se aos adversários com toda a sua inteligência e a sua determinação. O combate promete ser demorado.
14 de abril de 2025
O que a comunidade incel, o thriller Garota Invisível e a série Adolescência da Netflix tem em comum?
Recentemente, o termo incel voltou a ganhar destaque por conta do sucesso da mini série Adolescência da Netflix, que acompanha um adolescente acusado de assassinar uma colega de escola. A série vem sendo muito comentada nas redes sociais, tanto por sua qualidade técnica, já que cada um dos quatro episódios foi filmado em um longo plano sequência, quanto pelos temas que ela aborda e pela forma como mostra que tipo de adolescentes a internet e as redes sociais vêm "criando".
Incel é a junção das palavras involuntário e celibatário. Os incels seriam, portanto, homens heterossexuais que culpam as mulheres e a sociedade pela falta de sucesso romântico e sexual. Na lógica desses homens, as mulheres se tornaram muito exigentes e, por isso, muitos homens não estão obtendo sucesso para encontrar mulheres para se relacionar, frustrando-se e destilando ódio por elas. Para muitos incels, mulheres são privilegiadas, protegidas pelo poder público e altamente seletivas sexualmente. Um incel pode ser desde um jovem virgem, tímido e frustrado, até um homem raivoso e violento que encontra justificativa nessa lógica absurda para abusar de mulheres.
Conseguem imaginar a minha surpresa quando peguei pra ler o livro Garota Invisível, lançamento da Intrínseca, e me deparei com o termo incel? Ainda impactada com a série Adolescência, eu mergulhei nessa leitura e finalizei o livro em menos de 24 horas. Garota Invisível é um thriller que aborda o submundo dos fóruns incel da internet.
No livro, acompanhamos três pontos de vista: Saffyre é uma jovem traumatizada que é mandada para a terapia após sua família descobrir que ela se mutila. Cate é uma mulher que vive seus dias tomando conta da casa, dos filhos e do marido (que é o psicólogo de Saffyre). Cate e o marido estão se recuperando de uma crise no casamento. Por último, o terceiro ponto de vista é de Owen, um professor de 33 anos de idade que nunca teve um relacionamento amoroso e que acaba de ser afastado do trabalho por conta de uma acusação feita por suas alunas. Revoltado com a acusação, Owen encontra consolo num fórum incel.
Enquanto Adolescência parece um thriller, mas é um drama, Garota Invisível parece um drama, mas é um thriller. Saffyre irá desaparecer e a investigação envolverá a todos. Thriller está longe de ser meu gênero literário favorito. As fórmulas pré-prontas e replicáveis me incomodam um pouco. Na verdade, quando peguei Garota Invisível pra ler, minha motivação tinha sido o fato de ter um personagem psicólogo. Eu, como psicóloga, adoro ver como minha profissão é retratada na literatura e no cinema. Garota Invisível segue o padrão dos thrillers de ir desenrolando a história aos poucos, mantendo a tensão e revelando informações importantes em momentos estratégicos.
Apesar de não ser meu tipo favorito de leitura, Garota Invisível conseguiu me envolver rapidamente. Passei horas conversando com meu marido sobre o livro e entrei a madrugada lendo. Saffyre é uma narradora muito interessante. Seus traumas fazem dela uma personagem cheia de camadas e complexidade. Mas meu ponto de vista favorito foi o do Owen, porque ele é um personagem difícil de compreender, principalmente porque nem ele mesmo se compreende. Eu entendo perfeitamente as intenções da autora com esse personagem, mas ainda não tenho uma opinião formada sobre isso. Posso dizer que Lisa Jewell escolheu um caminho perigoso para o personagem (desculpa a frase misteriosa, mas não quero dar spoiler).
A parte que menos gostei do livro foi a resolução do mistério e a conclusão. Achei confusa e desnecessariamente mirabolante (algo que vejo constantemente em thrillers). Mesmo assim, ler esse livro foi uma experiência muito boa, principalmente pelas reflexões que ele propôs, sobre como as aparências enganam, sobre o perigo dos fóruns incels e sobre o risco de nos vermos seduzidos por ideias insanas quando estamos emocionalmente fragilizados.
Adorei a leitura e tenho certeza que é um livro que vai agradar a grande maioria dos leitores. Lisa consegue unir mistério, drama familiar e crítica social numa obra envolvente e coesa. Recomendo!!!
27 de março de 2025
Mar da Tranquilidade, de Emily St. John Mandel: uma leitura quase 5 estrelas
Vai ser difícil escrever essa resenha, mas vamos lá: vou começar dizendo que a vontade de ler esse livro surgiu depois que o Victor Almeida (Geek Freak) o indicou. Eu gosto das indicações do Victor porque, na maioria das vezes, nossos gostos combinam e as recomendações dele quase sempre funcionam comigo.
Recebi o livro e demoreeeeei pra começar a ler. Não sei explicar o porquê, mas toda vez que eu via o livro em cima da minha mesa, eu simplesmente preferia fazer qualquer outra coisa. Até que, cansada de procrastinar essa tarefa, eu iniciei a leitura. Foi difícil no começo e até procurei resenhas de outras pessoas pra tentar entender o que eu não estava conseguindo captar da história. E o tempo todo pensando: "Victor, você me prometeu!"
Essa dificuldade para me conectar com a história aconteceu principalmente porque não se trata de UMA história, mas de várias, em diferentes lugares e tempos. Começamos acompanhando o jovem Edwin St. Andrew, em 1912. Em seguida, o livro da um salto de 108 anos e nos apresenta outros personagens no ano de 2020. Mais algumas páginas e conhecemos Olive, uma autora em turnê de lançamento de seu novo livro no ano de 2203, quando os humanos já povoaram a lua. Mas é só na parte 4 do romance, que se passa no ano de 2401, que iremos conhecer nosso personagem principal (ou o mais próximo que temos de um personagem principal neste livro), Gaspery. E é só a partir daí que tudo vai fazer sentido, pois há uma estranha experiência que conecta todos esses personagens.
No geral, eu preciso de tempo para me envolver com uma história e fica difícil me vincular quando o livro fica pulando de uma época para outra. Então eu tive que insistir. E valeu muuuuito a pena ter insistido. Não que a história seja 100% original. Na verdade, eu tenho certeza que você, assim como eu, já assistiu ao menos um filme ou leu pelo menos um livro com essa mesma temática. Mas é uma temática tão interessante que não se esgota facilmente. E a autora, Emily St. John Mandel, conseguiu trazer inovação e, principalmente, sentimento pra essa história, com uma pitada de dilemas morais.
Eu sei que estou soando misteriosa e gostaria de poder falar mais sobre minha experiência, mas eu realmente não quero estragar o seu processo de leitura, pois tudo que eu disser a partir daqui será um grande spoiler (apesar da sinopse entregar TUDO). Eu não sou o tipo de leitora que gosta de ficar tentando desvendar os mistérios de um livro. Eu gosto de me deixar levar e de me permitir ser surpreendida na hora que a autora quis que eu me surpreendesse. Isso, na minha opinião, também garantiu que minha experiência de leitura fosse boa, porque eu senti o impacto de cada plot twist. Se você também gosta de se surpreender com o andamento da história enquanto ela acontece, não leia a sinopse do livro. Mas, mesmo lendo a sinopse e sabendo o tema principal, eu garanto que a leitura tem muito mais a oferecer. A revelação final é realmente incrível e muito tocante.
Mas não só de plot twists sobrevive um bom livro, né?! Mar da Tranquilidade também é cheio de reflexões tocantes sobre a vida e as conexões humanas. Eu marquei várias frases e é evidente que a bagagem literária da autora é grande, pois há também várias citações e paráfrases ao longo da história.
Um personagem que me interessou muito foi o primeiro apresentado no livro: o jovem de 1912. Todos os personagens voltam a aparecer posteriormente e eu aguardei ansiosamente o reaparecimento dele. Fiquei pensando que eu facilmente leria um livro inteiro só sobre ele e sobre tudo que o livro não mostrou da vida dele.
É divertido pensar que todas as respostas estiveram ali o tempo todo e esse é um daqueles livros que você tem vontade de voltar ao início assim que termina de ler, pra tentar ver os sinais que você ignorou na primeira leitura.
Terminei o livro com muitos sentimentos. Não foi uma leitura 5 estrelas pra mim, mas chegou muito perto. A história é muito boa, mas faltou envolvimento. Estranhamente, eu cheguei a conclusão de que faltaram páginas. Eu queria mais dessa história, com mais detalhes, mais desenvolvimento e menos saltos abruptos no tempo. Queria ter me apegado mais aos personagens pra ter me importado mais com as coisas que aconteciam com eles. O livro já tem uma carga emocional forte, mas com mais páginas isso teria sido ainda mais intenso. E digo isso principalmente quanto ao Gaspery. A história dele é linda e comovente, mas suas escolhas e decisões são pouco contextualizadas, simplesmente porque parece que não o conhecemos tão bem e não entendemos seus valores e o que o motiva.
Eu diria que foi uma leitura 4 estrelas, mas favoritada. Vocês favoritam livros que não são 5 estrelas? Pra mim não é tão comum, mas acontece de vez em quando. E aconteceu com Mar da Tranquilidade. Foi uma leitura emocionante e inteligente, mas poderia ter sido ainda melhor se eu tivesse me apegado mais aos personagens.
20 de março de 2025
Olhe de Novo, de Tali Sharot e Cass R. Sunstein: uma reflexão sobre a capacidade de ser (re)impressionar com o cotidiano
Olhe de Novo, livro publicado no Brasil em 2025 pela Intrínseca, vai falar justamente sobre isso: a importância de não se habituar completamente, de preservar a capacidade de se maravilhar com o velho e de recuperar a sensibilidade frente àquilo que já virou rotina. Quem não se lembra de uma primeira vez emocionante, né?! A primeira noite na casa nova, o primeiro dia de trabalho naquele emprego tão sonhado, a primeira vez que você ouviu aquela música que se tornou a sua favorita. Nós, leitores, dizemos frequentemente que queríamos "desler" um livro que amamos só para podermos ler de novo pela primeira vez, sentindo todas as emoções e surpresas.
Como psicóloga, muitas vezes eu busco, junto a minhas pacientes, a chamada habituação. Quando lidamos com medos e fobias em terapia, precisamos expor graduadamente o paciente àquilo que o deixa ansioso para, dessa forma, gerarmos um processo de dessenssibilização e habituação. Recentemente, tratei uma jovem com fobia de agulha e foi justamente isso que fizemos (essa história termina com ela colocando um piercing kk'). Por outro lado, como afirmam Sharot e Sunstein, habituar-se a tudo pode ser um problema.
O excesso de habituação pode nos levar a parar de apreciar as belezas da vida comum, os prazeres da rotina e as qualidades de nossos companheiros. Os autores vão ainda mais longe e afirmam que a habituação às coisas ruins também pode ter efeitos negativos. Isso porque, quando nos habituamos a algo ruim, nos desmotivamos a buscar a mudança. Se você se acostuma àquele trabalho ruim ou àquele relacionamento tóxico, você corre o risco de se acomodar. Mas como manter o encantamento com o cotidiano? E como não se acomodar ao que é ruim e nocivo? São essas e outras questões que os autores irão explorar ao longo do livro.
Eu gostei muito dessa leitura e sempre gosto de enaltecer livros com fundo técnico publicados por editoras que não são especialistas nesse tipo de publicação. A Intrínseca, inclusive, tem trazido ótimos títulos voltados para a área da Psicologia, Neurociência e Saúde Mental.
Uma das ideias mais intrigantes do livro é a de que "as coisas boas da vida só vão desencadear uma explosão de alegria se você as tiver de vez em quando". Aposto que você tem vários exemplos disso na prática. Eu, por exemplo, sempre amei Pizza Hut. Na minha cidade não tinha essa franquia, então eu comia sempre que viajava. Era sempre tão bom e tão prazeroso. Então eu me mudei e na minha nova cidade tem Pizza Hut. No início foi um sonho, chegou ao ponto de eu passar uma semana inteira comendo Pizza Hut todos os dias. Adivinhem o que aconteceu? Isso mesmo: eu enjoei. Faz meses que não como Pizza Hut. A conclusão dos autores é interessante: se você quer manter o encantamento, faça pausas, pois "o prazer resulta da satisfação incompleta e intermitente dos desejos".
Ao longo do livro, os autores fazem conexões entre a habituação e a criatividade, a saúde, a avaliação de riscos e a felicidade, além de analisarem eventos históricos e conceitos sociais pela perspectiva da habituação, explorando, por exemplo, a forma como as sociedades se habituam a coisas terríveis, o que eles chamam de habituação das massas.
Olhe de Novo é uma leitura fácil e cheia de insights e reflexões pessoais. Adorei a capa, que é simples, mas brinca com a ideia de limpar os olhos para ver melhor. Recomendo!
17 de março de 2025
Um olhar científico sobre o livro Terapeuta de Bolso, de Annie Zimmerman
Eu já expressei aqui no blog algumas vezes o apreço que eu sinto com o catálogo de livros sobre Psicologia e Saúde Mental da Intrínseca. Sempre que vejo um novo título, especialmente aqueles escritos por profissionais e pesquisadores da área, eu me interesso. Com Terapeuta de Bolso não foi diferente. O livro, escrito pela psicoterapeuta e pesquisadora Annie Zimmerman, promete ajudar as pessoas a se libertarem de velhos padrões e transformarem sua vida. Apesar da promessa um pouco exagerada, a autora realmente conseguiu incluir alguns assuntos interessantes e dicas muito boas.
O livro aborda problemas e desafios pontuais e fornece dicas e estratégias pontuais para lidar com eles. Os capítulos falam sobre temas como depressão, ansiedade, traumas, dependência, relacionamentos, solidão, traição, término e luto. A autora introduz através de histórias de pacientes ficctícios, demonstrando como acontece o trabalho prático do psicoterapeuta. É interessante acompanhar caso a caso, se identificar com os "personagens" e ver como a autora trabalhou cada assunto.
Porém, eu não gostei desse livro tanto quanto eu gostei de outros no mesmo estilo publicados pela editora. De todos os que li recentemente, esse foi o que eu achei menos "científico". Por exemplo, outro título publicado pela Intrínseca que eu li recentemente e também resenhei aqui no blog, chamado Felicidade Não é a Cura, traz conceitos muito bem embasados científicamente, enquanto que este parece mais um amontoado de reflexões, pensamentos e conclusões pessoais.
O perigo das conclusões pessoais é que elas não são verdades científicas e, logo, não servem para todo mundo. E, se estão impressas num livro, muitas pessoas vão achar que as respostas que estão ali são verdades absolutas. Vamos aos exemplos:
Na página 118, a autora afirma que "uma crítica interior é sempre uma crítica exterior que foi internalizada". Não! Apenas não. Uma crítica interior pode ter diversas origens, como comparações, autocobrança excessiva, rigidez cognitiva e, sim, uma crítica exterior que foi internalizada. Mas não se resume a isso.
Na página 156, Annie diz que "relacionamentos fantasiosos são uma defesa contra a intimidade. Enquanto acontecem na nossa cabeça, não estamos arriscando o amor verdadeiro". Fonte? Nenhuma! Fantasiar relações ou idealizar parceiros pode ter diversas causas e pode, inclusive, ter influencias midiátiicas envolvidas. Quem nunca quis viver um relacionamento digno de uma comédia romântica dos anos 2000?
O livro está repleto de declarações deterministas desse tipo e eu me pergunto: como alguém que trabalha com a mente e o comportamento humano pode ter uma visão tão limitada das experiências humanas? Eu tenho 8 anos de atuação como psicoterapeuta e se tem uma coisa que eu aprendi é que nada é simples, nada é preto no branco e toda experiência é subjetiva. Não existe resposta padrão. Não existe solução simples para problemas complexos.
O problema de você achar que tem todas as respostas é que você não se abre para ouvir genuinamente e entender o outro de verdade. Imagina você chegar na terapia, começar a expor seu problema e a psicoterapeuta dizer "É isso!!!!" sem te dar chance de explorar melhor aquilo, sem analisar seu caso de forma individual e subjetiva. Para a autora, tudo que o paciente trás é a "ponta do iceberg" (essa expressão é usada incontáveis vezes). E ela, claro, é quem tem as respostas e sabe o que está no inconsciente do iceberg (vocês não estão vendo, mas estou revirando os olhos agora).
Mas, por outro lado, o livro também trás algumas (poucas) boas reflexões, como alertar sobre a importância de aceitarmos nossas emoções e sabermos comunicá-las. Pra não citar só trechos horríveis, vou citar um bom aqui. Na página 277, a autora diz que "aprender a confiar nas pessoas tem menos a ver com encontrar alguém que nunca vai nos machucar, e mais a ver com aprender a confiar que seremos capazes de lidar com a situação se elas nos traírem". E sim!! Quando trabalhamos confiança em terapia estamos trabalhando a sua confiança em si mesmo e na sua capacidade de lidar com os problemas e desafios que aparecerem. Não uma confiança cega nos outros, mas uma confiança realista em si mesmo.
Enfim, como psicóloga que adora ler livros de Psicologia, eu infelizmente não gostei desse livro. Tem toda uma questão sobre abordagem psicológica que eu não estou nem um pouco a fim de abordar, porque esse assunto é polêmico. Mas, minha dica é: se você estiver em busca de ajuda psicológica, cuidado com abordagens que não cumprem todos os critérios tradicionalmente exigidos para serem classificadas como ciência.